Se eu morresse hoje, tornar-me-ia em poucas horas um homem notável, brilhante, com veia artística e de uma bondade incomparável, uma perda inaceitável para a humanidade. Como, porém, continuo vivo, sou intragável, mau, energúmeno, inútil, desprovido de talento e alguém que não faria falta se morto.
Vi muitas criaturas adquirirem uma elevação moral, intelectual e humana impressionantes pouco após pararem de respirar. Não sei se isso é fruto da miserável hipocrisia humana, que finge uma saudade na verdade inexistente, ou se é uma necessidade que as pessoas têm de se redimir perante os mortos que, segundo as crenças da maioria, poderiam viver fora da matéria e ter a capacidade de assustá-las e perturbar-lhes a vida. Ou se ainda é uma necessidade que as pessoas têm, para parecerem iluminadas, de notar num finado supostos atributos que imperceptíveis aos olhos dos outros.
A despeito da motivação dos necrológios, o indubitável é que são de uma artificialidade espantosa.
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