Alguns analistas afirmam uma evidência que nos salta aos olhos: Bolsonaro já não governa. Hora então de considerá-lo página virada na vida nacional e voltar a atenção para aquele ou aqueles que agora detém(êm) o timão da Nação? Não sei. A meu ver seria precoce. Até o presente momento o tresloucado capitão vem tentando criar um clima para reativar o setor produtivo com fraudes baratas e inócuas, tendo inclusive produzido a encenação de uma pseudoprofessora que clamava por golpe militar. Vai que amanhã um desses ardis baratos cola.
Em 1989, achei que a aparição de Míriam Cordeiro para derrubar Lula no segundo turno da eleição presidencial seria um tiro que sairia pela culatra, por ser um recurso sórdido e vil demais, típico de novelas de enredo piegas e de má qualidade. Mas não foi: garantiu a Collor a eleição. Colou. Não vai daqui nenhuma manifestação de apoio a Lula ou ao PT. Nem vejo motivo para tanto. Lembrei o fato só para ilustrar que em política tudo pode acontecer.
Imagine se a próxima fraude for Bolsonaro "salvando uma criança de um prédio em chamas". Ou "defendendo-se de um ataque de um monte de ninjas vermelhos com estampas de foice-e-martelo no peito e nas costas". Imagine a comoção nacional e a glorificação do presidente na primeira hipótese, a revolta dos anticomunistas e os apelos aos militares para que intervenham na segunda. Além disso, o ex-militar está se dando a reunir uma equipe de médicos para a pesquisa dos possíveis efeitos da clororquina contra o coronavírus -- e aí a gente tem de rezar fervorosamente pra que ele obtenha grande sucesso, ainda que sabendo que isso lhe valerá o resgate da popularidade e a muito provável reeleição em 2022. Teremos de lutar muito, mas não podemos jamais torcer contra a vida e a favor da morte.
Todos os de bom-senso não acreditariam em atos tão heroicos do capitão (o mérito do suposto sucesso contra a Covid-19 seria dos médicos, e Bolsonaro só recorreu aos profissionais para atender aos interesses dos grupos econômicos que defende), mas este (Bolsonaro) conta com o apoio de duzentos empresários de extrema-direita, inclusos na legião de cinquenta e sete milhões de brasileiros que o elegeram. São, além dos empresários que citei, esses eleitores donos de empresas, banqueiros, financistas, policiais, militares, paramilitares, antipetistas ferrenhos e extremosos, antissocialistas e anticomunistas radicais -- alguns por terem um patrimônio considerável, outros por ignorância mesmo -- ricos e inúmeros classe-média que se veem como ricos, membros de classes mais desfavorecidas, porém desprovidos do menor conhecimento político ou histórico. Somem-se e/ou encontrem-se entre os já mencionados os truculentos, os homofóbicos, os falsos moralistas, os misóginos, os sexistas, os racistas, os antidemocráticos, os neofascistas, os completamente despidos de caráter, de lealdade e de outros verdadeiros atributos morais.
Com algumas defecções, esses grupos votarão em massa em qualquer coisa que se apresente contra o PT, contra o socialismo e a favor do neoliberalismo, quer por ideologia, interesses, picardia ou burrice mesmo.
Em conclusão, analise-se bem e perceba-se: Bolsonaro não é o maior problema. O problema são cinquenta e sete milhões de eleitores. Os filhos e netos dos que votaram em Jânio Quadros em 1960, os eleitores e filhos dos que optaram por Collor em 1989, os que tentaram eleger Eneas em 1994, aqueles que conduziram em 2018 o ex-militar ao Planalto. Quem vier com um discurso moralistoide, do tipo prendo-e-arrebento, acabo-com-a-mamata, Deus-acima-de-tudo, em-nome-da-família, dou-fim-à-corrupção... o que vier com esse discursinho barato leva a cadeira presidencial. Quanto à corrupção, aliás, vale um comentário bastante oportuno: como é que uma população com tantos corruptos tem um discurso tão feroz contra a corrução? Acho que é porque fica um querendo acabar com a corrupção do outro.
Ah! Ia-me esquecendo: como é que os brasileiros prezam tanto a família e gastam tanto tempo e dinheiro com amantes?
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