Pesquisar este blog

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

DUETO DA DESPEDIDA


ELA:

Amor, eu bem sei que não volta,

E a tristeza me sai pelo poros

Como sangue que aflora na pele

Da ferida do meu coração.



ELE:

Amor, sei, nos fundimos num só,

Mas ficou tudo à volta sombrio

E com tantas tempestades e espinhos...

voltarei ao florir do verão.



ELA:

A partida me faz desolada,

Tão sem norte, sem vida e sem chão.

Meu amor, nunca mais você volta,

Fez-me escrava da mortal solidão.



ELE:

Em meu corpo levo o gosto do seu,

As lembranças se ataram a mim

Qual meus pelos, as unhas, as mãos:

Volto quando a primavera chegar.



ELA:

Eu mal sei se haverá primavera,

Se o verão nos virá iluminar.

Sei apenas que a vida é tão breve:

Você nunca, amor, vai voltar.


QUE SILÊNCIO!

 Meu Deus, que silêncio

nos becos, esquinas, 

nas ruas, sobrados,

Trazido no vento

das mil fortalezas!



Seria o prelúdio

dos gritos medonhos,

dos breus diminutos

com cheiro de sangue,

ali no porvir?



Seria a antessala

das rédeas, mordaças,

dos olhos fechados,

dos peitos calados,

das mentes vazias?



Será que os demônios

horrendos, ferozes,

com garras agudas...?

Virão, pavorosos, 

os vis canibais?



Meu Deus, que silêncio

que aperta meu peito, 

arregala meus olhos!

Meu corpo tremendo:

meu Deus, que silêncio!


quinta-feira, 8 de setembro de 2022

HOJE MORREU A RAINHA, NADA MAIS ACONTECEU NO MUNDO

  Hoje, segundo a mídia brasileira, nada aconteceu além da morte da rainha Elizabeth II.  Nenhum tiro na Ucrânia, nenhum assalto no Rio ou acidente de trânsito em qualquer parte do país.  Morreu a rainha, nada, nada mais aconteceu!   Até todos os abusos e absurdos cometidos por Bolsonaro ontem, 7 de setembro, estão desacontecidos.  Não houve nada e fim! Assim que foi anunciado o óbito da nobre, todos os acontecidos ficaram por não acontecidos, todos os ditos ficaram por não ditos, e o Brasil, sem eleições e ameaças golpistas, em fascismo,  tão livre de problemas, foi por desígnio da imprensa convertido à nacionalidade inglesa e obrigado a enlutar-se por uma morta que, enquanto viveu, não era morta (obviamente) nem nossa.  Agora é.   É nossa finada.  Não vai daqui nenhum desrespeito à rainha ou à morte -- quem, como eu, não crê em Deus ou vida além da matéria não se conforma ante a morte e se compadece profundamente de qualquer criatura que perde a vida.   Porém o que me incomoda é que hoje tivemos muitos mortos que sequer foram citados, além de o país ter tantos defuntos (dentre esses muitos em decorrência da fome, da falta de política de saúde, da carência de tudo nos hospitais, da violência, do feminicídio, do infanticídio, do latrocínio, etc...) que não pode se dar ao luxo de viver o luto dos outros.
Os jornalistas foram da consternação aos louvores ao antes príncipe, mas agora rei Charles.  Não confundir com Ray Charles, que já morreu e era músico, tinha mais história, mais charme e mais talento, enquanto o Charles rei é sem graça e sem simpatia, e seu único feito foi passar esses seus 72 anos coçando o saco, à espera do episódio de hoje para sentar no trono -- e continuar brincando com os testículos.
Aliás, esse negócio de órgãos genitais masculinos tá muito em moda no Brasil, desde ontem, quando aquela multidão louvou de forma exultante, fervorosa e religiosa o pênis do Bolsonaro.  Pois que usufruam e se regalem daquela coisa que o "imbrochável" já confessou ter na juventude introduzido numa galinha (num ato de doentia, extrema e revoltante perversidade) e que deve ser fétida como tudo o que ele tem dentro da caixa craniana.
Amanhã no entanto a vida deve continuar.  Ou não.  As questões e os luxos ligados à família real britânica podem  continuar sendo um apetitoso prato pra mídia continuar saboreando bem devagar ao longo desta e da próxima semana, por serem, na visão desse pessoal dos meios de comunicação, muito mais importantes do que a fome, a miséria, o desemprego, a violência, a falta de comida e de saúde e o excesso de tudo o que é ruim no Brasil dos dias de hoje.

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

A CANTORA

A cantora

Cantava como se fosse um arcanjo,

E a sua voz de seda  revolvia os meus sentimentos mais fundos,

E fazia deslizar no meu rosto um fio de lágrima.

Vinham-me à flor da pele as emoções mais doces,

E eu me vi, de súbito, num transe sublime,

Adentrando um céu sereno e suave, levitando entre as  nuvens alvas da paz.