Para começar, como sabemos, a abolição dos escravos no mundo inteiro não teve nenhuma motivação humanística, mas puramente econômica. O planeta levou em torno de cinco mil anos para entender que um trabalhador assalariado sai bem mais barato do que um escravo. O Brasil foi lamentavelmente o último país do mundo a compreender isto.
Com a Revolução industrial, em meados do século XVIII, os países passam a precisar de uma massa assalariada para consumir os artigos industrializados. Os barões da indústria precisavam acumular riquezas a partir do consumo das classes trabalhadoras, mas nem por um momento tais riquezas foram distribuídas de forma justa, mas tão somente concentradas nas mãos de poucos.
O contexto hoje é o mesmo. O capitalismo industrial deu lugar ao capitalismo financeiro. A concentração de renda continua incidente e não deixa dúvidas de que as coisas assim serão para todo o sempre. Mas há um grande diferencial entre os países ricos e o Brasil.
Nos países de primeiro mundo há um respeito maior às classes trabalhadoras, há maior valorização da mão-de-obra, o Estado garante requisitos básicos como saúde, educação, habitação, e as corporações se agrupam em instituições sindicais mais sérias e mais sólidas. Ou seja, os laboradores do Brasil estão longe de ter o mesmo poder de fogo dos europeus e americanos, e, se Estados Unidos e Inglaterra estão entre os capitalismos mais selvagens do planeta, por outro lado mantêm uma relação menos cruel com os seus assalariados, que gozam de melhor remuneração e maior assistência social. Enquanto o Brasil ainda é escravocrata. Não consegue até hoje entender que que uma massa bem remunerada só viria a fortalecer a indústria e a atividade comercial, traria desenvolvimento, geraria ainda mais emprego e daria vida a uma sociedade desenvolvida.
Mas os capitalistas daqui são retrógrados como os donatários das capitanias hereditárias, que eram delinquentes e assassinos sem princípios, moral ou caráter, broncos, estúpidos, preguiçosos, não tendo outro intuito senão o de tirar vantagens de quaisquer situações que se lhes apresentassem. Mas o mais triste é que não houve uma mudança de mentalidade. E uma das situações de que falo é o momento presente, frágil e crítico, da economia nacional. Os donatários passaram a seus filhos sua visão econômica perniciosa, e estes por sua vez fizeram o mesmo em relação aos descendentes, e foi assim sucessivamente: pai passando para filho ideias nocivas de capitalismo, até os dias de hoje, e os capitalistas atrasados de agora, representados pelo governo Temer, valem-se deste momento delicado para imporem à sociedade uma reforma trabalhista e previdenciária inaceitáveis e de uma crueldade social que o mundo talvez jamais haja experimentado. Oportunistas, querem passar à opinião pública a ideia de que é o único meio de tirar o Brasil da crise.
Incompreensível o fato de o fato de a população não sair às ruas todos os dias para protestar contra projetos tão estapafúrdios e demoníacos. O Brasil quer criar uma mão-de-obra quase escrava, ainda não conseguiu entender que o trabalhador satisfatoriamente assalariado é um consumidor em potencial que levaria o país ao desenvolvimento tão propalado, sonhado e jamais conquistado. Aliás, o Brasil ainda não consegue sequer entender por que em 1888 a Lei Áurea soltou as amarras dos escravos, que para os empresários poderiam perfeitamente estar a trabalhar gratuitamente, embora custassem uma verdadeira fortuna aos seus senhores e nada pudessem comprar. Despido da mais diminuta compaixão ou do menor fragmento de inteligência, prefere atribuir o ato a uma caridade sem razão nem cabimento da Princesa Isabel.