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domingo, 23 de dezembro de 2018
JOÃO DE DEUS COLOCOU O ESPIRITISMO EM XEQUE
O caso João de Deus suscita (ou ressuscita) as antigas dúvidas e descrenças acerca das chamadas curas espirituais realizadas em centros espíritas, igrejas e outros lugares onde supostamente operam-se "milagres" de todo ou quase todo gênero. Propagadas largamente pela mídia, que na falta de matéria sempre as explora, essas obras fantásticas e questionáveis foram ao longo das décadas impressionando e enchendo de interesse e esperanças o grande público, que ficava a se perguntar se era possível haver entre o céu e a terra muito mais do que o sonhado pela vã filosofia. Divulgações desse tipo levaram legiões de doentes e desenganados aos cuidados de "médiuns", "reveladores divinos" e outros supostos operadores de façanhas que vão além do entendimento humano e do que acreditam as ciências.
Meu ceticismo não decorre da desinformação ou da pura e simples intransigência de quem não quer crer de forma alguma. Estive nesses meus seis decênios de vida em igrejas, centros de espiritismo africano e casas espíritas kardecistas, racionalistas e esotéricas, observando e analisando filosofias, sermões, pregações, palestras... e assim cristalizei minha visão sobre as religiões. Logo a princípio descartei qualquer possiblidade, por mais que fosse remota, de adotar o catoliocismo ou o protestantismo, por sua raiz comum cercada de mitologia, impossibilidades e preconceitos e relatos descabidos. No mesmo patamar de incredibilidade coloco as religiões africanas. No kardecismo vi muitas lacunas e influências católicas (não creio em evangelhos, e os kardecistas teimam em seguir uma interpretação própria do que escreveram Mateus, Lucas, João e Marcos), no Racionalismo Cristão muitas respostas faltaram, e o esoterismo me pareceu muito permeado de crenças absurdas.
Contudo, a divulgação (ou criação midiática ou mística) de sucessos em tratamentos espirituais de doenças graves me chamou muito seriamente a atenção: aqueles relatos de as pessoas livrarem-se de cânceres e outras doenças mortais a partir de tratamentos espirituais me fizeram refletir muito.
Não creio definitivamente em Deus, mas Deus e espiritualidade são duas coisas inteirametne distintas e independentes, ou seja, Deus poderia existir e não haver vida após a morte nem qualquer outro espírito, os espíritos poderiam existir, mas Deus, não. Assim eu poderia ser ateu mas espiritualista. João de Deus, entretanto, joga qualquer embrião de crença, qualquer boa-vontade, qualquer análise... joga tudo, tudo por terra! Colocou em xeque o próprio espiritismo. Porque, se levarmos em conta o que propalam os palestrantes, entidades de luz e de infinita bondade e pureza atuariam utilizando como canais os médiuns e praticariaqm as curas a curto, médio ou longo prazo. Para o fenômento acontecer, no entanto, far-se-ia mister que o médium também estivesse com pensamentos puros, bons e fosse de ótima índole e boa-fé. em moutras palavras, em perfeita sintonia com tais espíritos.
Deste modo, as tão publicadas curas, se realmente houve alguma, só podem ser atribuídas a algo que poderíamos entender como poder mental ou auto-sugestão do paciente: uma fé inabalável e uma infinita crença na possibilidade de curar-se. Li aos quinze anos "O Domínio de si Mesmo pela Auto-Sugestão", de Émile Coué https://www.jrmcoaching.com.br/blog/o-poder-da-sugestao-as-3-leis-de-emile-coue/ https://citacoes.in/autores/emile-coue/
http://www.psicanalise.psc.br/coue.htm , obra em que o autor defendia ser possível que um ser humano livre-se de alguns males através do pensamento de cura, mas não sei se a seu ver isso se aplicaria a doenças graves como câncer, Aids e outras bastante devastadoras.
Enfim, embora não possa negar ou afirmar peremptoriamente a existência ou inexistência de vida além da matéria, acho muito pouco provável que haja no Universo algo além do que captam os cinco sentidos. A única certeza que tenho é que todos esses milagreiros dos centros espíritas, das igrejas, de sei lá mais onde... que esses milagreiros demandam cadeia ou, na melhor das hipóteses, tratamento psiquiátrico.
Meu ceticismo não decorre da desinformação ou da pura e simples intransigência de quem não quer crer de forma alguma. Estive nesses meus seis decênios de vida em igrejas, centros de espiritismo africano e casas espíritas kardecistas, racionalistas e esotéricas, observando e analisando filosofias, sermões, pregações, palestras... e assim cristalizei minha visão sobre as religiões. Logo a princípio descartei qualquer possiblidade, por mais que fosse remota, de adotar o catoliocismo ou o protestantismo, por sua raiz comum cercada de mitologia, impossibilidades e preconceitos e relatos descabidos. No mesmo patamar de incredibilidade coloco as religiões africanas. No kardecismo vi muitas lacunas e influências católicas (não creio em evangelhos, e os kardecistas teimam em seguir uma interpretação própria do que escreveram Mateus, Lucas, João e Marcos), no Racionalismo Cristão muitas respostas faltaram, e o esoterismo me pareceu muito permeado de crenças absurdas.
Contudo, a divulgação (ou criação midiática ou mística) de sucessos em tratamentos espirituais de doenças graves me chamou muito seriamente a atenção: aqueles relatos de as pessoas livrarem-se de cânceres e outras doenças mortais a partir de tratamentos espirituais me fizeram refletir muito.
Não creio definitivamente em Deus, mas Deus e espiritualidade são duas coisas inteirametne distintas e independentes, ou seja, Deus poderia existir e não haver vida após a morte nem qualquer outro espírito, os espíritos poderiam existir, mas Deus, não. Assim eu poderia ser ateu mas espiritualista. João de Deus, entretanto, joga qualquer embrião de crença, qualquer boa-vontade, qualquer análise... joga tudo, tudo por terra! Colocou em xeque o próprio espiritismo. Porque, se levarmos em conta o que propalam os palestrantes, entidades de luz e de infinita bondade e pureza atuariam utilizando como canais os médiuns e praticariaqm as curas a curto, médio ou longo prazo. Para o fenômento acontecer, no entanto, far-se-ia mister que o médium também estivesse com pensamentos puros, bons e fosse de ótima índole e boa-fé. em moutras palavras, em perfeita sintonia com tais espíritos.
Deste modo, as tão publicadas curas, se realmente houve alguma, só podem ser atribuídas a algo que poderíamos entender como poder mental ou auto-sugestão do paciente: uma fé inabalável e uma infinita crença na possibilidade de curar-se. Li aos quinze anos "O Domínio de si Mesmo pela Auto-Sugestão", de Émile Coué https://www.jrmcoaching.com.br/blog/o-poder-da-sugestao-as-3-leis-de-emile-coue/ https://citacoes.in/autores/emile-coue/
http://www.psicanalise.psc.br/coue.htm , obra em que o autor defendia ser possível que um ser humano livre-se de alguns males através do pensamento de cura, mas não sei se a seu ver isso se aplicaria a doenças graves como câncer, Aids e outras bastante devastadoras.
Enfim, embora não possa negar ou afirmar peremptoriamente a existência ou inexistência de vida além da matéria, acho muito pouco provável que haja no Universo algo além do que captam os cinco sentidos. A única certeza que tenho é que todos esses milagreiros dos centros espíritas, das igrejas, de sei lá mais onde... que esses milagreiros demandam cadeia ou, na melhor das hipóteses, tratamento psiquiátrico.
sexta-feira, 28 de setembro de 2018
ELEITOR NÃO PODE SER PASSIONAL
As pessoas deveriam ser pragmáticas e voltar os olhos para o Congresso Nacional, que é o que vai endossar ou não os desmandos do futuro-presidente da República. Há políticos e partidos que são essencialmente venais e concordam com tudo o que o poder central proponha, em troca de vantagens que este lhes ofereça. Esses políticos e agremiações acabam por ter mais peso na vida nacional do que o próprio chefe do Governo, pois decidem o que acontece ou não no País: por isso devem ser banidos da vida pública.
Esbugalhem os olhos na direção dos parlamentares e deixem de fanatismos: cultuar Bolsonaro ou Lula como verdadeiros deuses de carne e osso nada constrói. Muito pelo contrário, o fanatismo sempre destruiu: foi o responsável pela ascensão de Hitler, a Segunda Guerra Mundial, a morte de mais de seis milhões de judeus e mais de vinte e sete milhões de soldados e civis. Fez florescer no Irã o regime dos aytolás e causou a morte de homossexuais e dos avessos a estes líderes políticos travestidos de sumos religiosos. Deu vida ao stalinismo, que nada teve de socialista ou comunista e só reprimiu, condenou a trabalhos forçados e matou os opositores de Stálin nos campos de concentração soviéticos. Levou mais de novecentas pessoas ao suicídio coletivo em obediência a um pedido de um louco como Jim Jones. O fanatismo leva à guerra fratricida, à divisão entre a população e ao fortalecimento dos tiranos.
Por favor, concentrem sua atenção nos deputados e senadores: eles que decidem se vai haver ou como vai ser a maldita reforma da previdência, quanto você vai ganhar de salário e o tanto que vai pagar de impostos. Vão determinar se você ou seus filhos terão acesso à saúde, educação, habitação, segurança e outros direitos sagrados de qualquer cidadão. Se votarem em parlamentares e partidos honestos, o presidente da República, por mais que seja mal-intencionado, jamais conseguirá implantar um regime autoritário e massacrar as classes pobres e trabalhadoras, a classe média e o povo de um modo geral.
sábado, 14 de julho de 2018
VOU-ME EMBORA
Não, não fico, parto, vou-me embora.
Abandono o amor perverso e sem recíproca.
Não, não levo uma viola, pois não toco,
Mas solfejo no caminho as melodias mais bonitas
E murmuro os versos que a mim sempre comoveram.
Vou pr'um canto onde os dias sejam frescos
E o sol toque de leve as paredes desbotadas.
Um recanto calmo e de pura e singela poesia,
Onde seja muito mais brilhante a estrela D'Alva.
Vou-me embora e despido deitarei sob uma sombra
pr'uma fêmea eventual me abusar inteiramente
E transpormos os limites existentes do pudor.
Cuidarei que seja em mim eterna a juventude
Que os decênios, fios brancos, rugas, desencantos,
Que as vivências e que as dores, nada pôde destruir.
Vou-me embora pr'um lugar bonito e simples
Onde a paz despeje em mim sua brandura
E as narinas sintam os cheiros bons das frutas e do amor.
Abandono o amor perverso e sem recíproca.
Não, não levo uma viola, pois não toco,
Mas solfejo no caminho as melodias mais bonitas
E murmuro os versos que a mim sempre comoveram.
Vou pr'um canto onde os dias sejam frescos
E o sol toque de leve as paredes desbotadas.
Um recanto calmo e de pura e singela poesia,
Onde seja muito mais brilhante a estrela D'Alva.
Vou-me embora e despido deitarei sob uma sombra
pr'uma fêmea eventual me abusar inteiramente
E transpormos os limites existentes do pudor.
Cuidarei que seja em mim eterna a juventude
Que os decênios, fios brancos, rugas, desencantos,
Que as vivências e que as dores, nada pôde destruir.
Vou-me embora pr'um lugar bonito e simples
Onde a paz despeje em mim sua brandura
E as narinas sintam os cheiros bons das frutas e do amor.
sábado, 26 de maio de 2018
NÓS, OS MALUCOS BELEZA DE JACAREPAGUÁ
Os personagens, histórias e situações são todas reais, apenas os nomes são fictícios.
Conheci a Ângela num boteco da Estrada de Jacarepaguá, de uma forma meio adversa. Era professora de história, uma mulher branca, meio gorda e masculinizada, tez avermelhada, descendente de alemães. Era 1990, dia do jogo Brasil X Argentina, em que perdemos por um a zero. Eu passara a tarde assistindo ao evento esportivo, certo de que o Brasil venceria de goleada, mas o priomeiro gol não saía; não saía e acabamos tomando ao final do jogo. Terminada a partida, desci, entrei no bar e pedi uma cerveja. Os comentários não podiam ser outros senão o jogo, e eu tive a infelicidade de dizer que torceria pela Argentina na final. Foi quando a Ângela, que nem sequer me vira antes, retrucou com veemência:
--Pela Argentina não torço! Meu pai foi adido comercial lá... -- depois baixou a cabeça e resmungou sem nenhum cuidado para que eu não ouvisse: "Idiota!"
Alguns dias depois, entretanto, acabamos conversando amenidades e o momento político. Foi quando passou a simpatizar comigo: ambos éramos radicalmente contra o governo Collor e acreditávamos que existia socialismo; assim, éramos de esquerda. Comunhão de pensamentos à parte, numa outra oprtunidade ela me soltou um outro "idiota". Juro que numa terceira vez eu acabaria por me acostumar.
O nosso grupo tinha o Maurício, um jovem músico recém-formado, também simpatizante do socialismo e que, além de ser um etilista respeitável, um dia me exibiu o dedo inchado e disse que conseguira aquela proeza cheirando cocaína. Como aquilo sucedera eu não me lembro, não sei se por ter sido afetado de esquecimento pós-alcoólico ou se por ele não ter explicado nada simplesmente. Noutra ocasião apareceu com um braço na tala e tipóia, e me contou:
--Foi num condomínio lá da rua Ituverava...
--O que foi que aconteceu? -- perguntei.
--Tinha ido tomar umas cervejas e, no caminho de casa, deu vontade e eu quis dar uma mijada em frente ao condomínio. Apareceu um "gorila branco", que fazia a segurança por lá e disse pra eu não fazer. Eu respondi: "Meu amigo, a rua é pública", e comecei a mijar. O cara me arrebentou na porrada: era um gorila, gorila mesmo!
Uma vez convidei a Ângela pra jantar em minha casa, com minha primeira mulher e minhas filhas, que ainda eram pequenas. Foi feita uma peixada, e ela já chegou embriagada e roubando um pedaço de posta do prato de uma das minhas meninas. Depois de as crianças dormirem, propôs que eu a ex-esposa fumássemos maconha no apartamento, junto com ela. Nunca fomos de drogas, não topamos. Passados alguns minutos, a mulher foi ao banheiro, saiu e, de volta para a sala, remexeu-se um pouco e deixou que lhe caísse a bermuda de cadarço, ficando de blusa e calcinha (por sinal um calçolão). Era uma visão aterrorizante. Felizmente ela nao tardou a se recompor.
Contou que num colégio onde dera aulas dissera:
--Consta que Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil...
Motivo pelo qual foi advertida pela diretoria:
--Você não pode dizer isso aos alunos.
Em aula seguinte repetiu a dose. Foi demitida.
Ainda contou -- não sei se mentindo ou dizendo a verdade -- ter na juventude sido mulher do Manfredo Colasanti, de haver passado uma noite inteira com o Lupecínio Rodrigues, de haver morado com alguns artistas bem baderneiros e dividir com eles o repúdio e a antipatia dos vizinhos.
Naquele período entretanto vivia com um mecânico beberrão e brigão, que odiava, à minha exceção, todos os amigos da mulher que moravam no bairro, pelo fato de eles sempre dividirem drogas com ela.
Uma vez um desses amigos, numa roda de cinco ou seis, perguntou se eu toparia um dia dar uns tecos, fazer sexo grupal e exercer atividades bissexuais. Respondi que tinha medo de usar drogas pelo risco de prisão e de ficar dependente e que, quanto à atividade bissexual, embora não me posissionasse contra, não tinha curiosidade nem interesse em praticá-la.
--Se é cético, já é um bom caminho. -- replicou ele com o apoio da Ângela.
Lá pelas duas da madrugada, quando este estava em outro bar, sentado com dois outros rapazes, resolvi, já bêbado feito um indigente doidão, fazer uma gozação com ele:
--Olhem, meus amigos, procurem não ir embora pra casa, não, porque depois vou distribuir "brioco" pra todo mundo.
Os dois riram sem entender nada, o que propusera também riu, mas um riso amarelo e extremamente sem graça. Naqueles dias as pessoas tinham vergonha de assumir a homossexualidade. Saí dali e fui perturbar outro.
Havia na Freguesia bares inteligentes. Salvo a Ângela, que tinha exatos cinquenta anos, éramos todos jovens e politicamenre embasados como a mulher. Eu era talvez o menos louco. Mas todos tínhamos responsabilidade política e social. Nós versávamos sobre diversos assuntos. Gostávamos de bons filmes, de músicas de boa qualidade, interessávamos-nos pela história do Brasil e do mundo, pela política nacional e internacional, pelos personagens que marcaram a vida do planeta. Nossa mesa de bar era rica em assuntos.
Não votávamos em ninguém por ser jogador de futebol, galã, palhaço, apresentador de tevê. Tínhamos aversão ao que chamávamos de direita, não achávamos bonito desempregar legiões de pais de família. Não nos passaria pela mente nada parecido com reforma trabalhista, previdenciária ou qualquer outra que servisse de instrumento para agredir quase uma sociedade inteira. Não comíamos estrume pelos olhos e ouvidos, pois não acreditávamos na grande imprensa nem nos formadores de opinião da mídia. Repelíamos com intensidade a tecnocracia, por sua total e absoluta carência de humanismo.
Não votávamos em ninguém por ser jogador de futebol, galã, palhaço, apresentador de tevê. Tínhamos aversão ao que chamávamos de direita, não achávamos bonito desempregar legiões de pais de família. Não nos passaria pela mente nada parecido com reforma trabalhista, previdenciária ou qualquer outra que servisse de instrumento para agredir quase uma sociedade inteira. Não comíamos estrume pelos olhos e ouvidos, pois não acreditávamos na grande imprensa nem nos formadores de opinião da mídia. Repelíamos com intensidade a tecnocracia, por sua total e absoluta carência de humanismo.
Havia por ali também gente reacionária, mas que a era por ignorância, estupidez, não levada a sério pelos esclarecidos, dentre os últimos o Célio, um "marchand" que, progressista, pregava no deserto suas ideias, ante o silêncio dos imbecis, que não o questionavam por puxassaquismo, já que esse ostentava boa posição social. Uma vez ele disse, com muita propriedade, que "o Brasil é um país bom pra se roubar, não pra se ganhar dinheiro". Os calhordas que não o retorquiam ficavam a ponto de querer me linchar quando eu defendia pensamento igual ao daquele homem. A grande parte deles já deve ter ido para o Inferno. Infelizmente a Ângela e o marido podem não estar mais vivos, e o "marchand" estará, se não morreu, estar pelos setenta e poucos anos.
Dizíamos não, tínhamos convicções firmes, e acho que, assim como eu, todos viram ao longo de todos esses anos os bares tornaram-se pobres de ideias, plenos de alienação e emburrecerem. Vimos a alienação crescer, encorpar-se, o futebol ser a prioridade absoluta de uma nação. Vemos uma sociedade assistir aos desmandos de políticos inescrupulosos sem um protesto sequer, de uma forma lamentavelmente bovina.
segunda-feira, 15 de janeiro de 2018
O CAOS DA CULTURA NACIONAL
Houve um sábado em que tomei coragem e assisti ao “Altas Horas”, com Serginho Groismann, que ali teve a desfaçatez (que aliás tem quase todo santo sábado) de exibir ao grande público alguns entre os mais consagrados expoentes da breguice, do mau-gosto e do bizarro que hoje grassam na cultura nacional.
Imagine que tínhamos naquele dia, entre outros culturicidas, Nego do Borel, que além de tentar cantar, relatava num requinte pavoroso de crueldade que já fizera um dueto com Wesley Safadão. Nossa mãe!!!! Sabe o que é um dueto de Nego do Borel com Wesley Safadão?! É um atentado cruel e sanguinolento ao bom-gosto, de deixar qualquer criatura dotada do menor bom-senso estarrecida e deprimida, saturada da vida e desgostosa do mundo.
Como não bastassem Nego do Borel e outros da mesma má qualidade, o apresentador ainda teve a coragem de convidar o Pablo Vitar, eleito pela Globo “a revelação do ano de 2017”. Puxa! Já revelamos coisas muito melhores. Antigamente nosso artista do sexo masculino que cantava com voz feminina era o Ney Matogrosso, de canto bonito e expressão infinita, dotado de uma técnica de cantar perfeita. Depois do Ney, surgiu o Edson Cordeiro, um fenômeno capaz de executar barítono, tenor, contralto, soprano, numa maestria singular. Pena que este tenha desaparecido do cenário nacional: é assim a cultura brasileira de hoje, que renega os bons. Se Matogrosso e Cordeiro são dois antigos e potenciais talentos, esse Pablo é lamentável como artista.
Numa vã tentativa de assemelhar-se a uma mulher, a atual “revelação”, com cabelos compridos, vestido curto e falando e cantando em falsete, mais parece um participante perdido e desgarrado dos blocos das “piranhas” do Carnaval. A voz é feia, frágil, irritante, rachada, e o cantor não tem técnica nem competência para usar o que já não é nada bom. Um pseudotalento criado pela mídia, sem nada que possa lastrear o rótulo que lhe dão.
A área cultural no Brasil de hoje é isso. O declínio foi grande, houve um quase aniquilamento da nossa cultura. Copacabana fechava os finais de ano com apresentações de Tom Jobim com Mílton Nascimento, Chico Buarque e Caetano Veloso. Hoje os sertanOjos (como diz Rita Lee), funkeiros, pagodeiros, cantores de axé é que dominam a MPB, tão esfrangalhada e aviltada pelas gravadoras, pelos intérpretes e compositores e pelo mau gosto popular.
Caímos da poesia de Belchior pro ridículo nada-dizer do Michel Teló, de Jessé pra Luan Santana, de Gal Costa pra Anita, de Bethânia pra Valeska Popozuda, de Tim Maia pros Mc's. Uma verdadeira degradação artístico-cultural. O caos da cultura. Caos este que não é mais que um dos reflexos e uma das facetas do deplorável caos social, moral e político que hoje o Brasil vive e do qual imagino que infelizmente jamais irá se libertar.
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