Houve um sábado em que tomei coragem e assisti ao “Altas Horas”, com Serginho Groismann, que ali teve a desfaçatez (que aliás tem quase todo santo sábado) de exibir ao grande público alguns entre os mais consagrados expoentes da breguice, do mau-gosto e do bizarro que hoje grassam na cultura nacional.
Imagine que tínhamos naquele dia, entre outros culturicidas, Nego do Borel, que além de tentar cantar, relatava num requinte pavoroso de crueldade que já fizera um dueto com Wesley Safadão. Nossa mãe!!!! Sabe o que é um dueto de Nego do Borel com Wesley Safadão?! É um atentado cruel e sanguinolento ao bom-gosto, de deixar qualquer criatura dotada do menor bom-senso estarrecida e deprimida, saturada da vida e desgostosa do mundo.
Como não bastassem Nego do Borel e outros da mesma má qualidade, o apresentador ainda teve a coragem de convidar o Pablo Vitar, eleito pela Globo “a revelação do ano de 2017”. Puxa! Já revelamos coisas muito melhores. Antigamente nosso artista do sexo masculino que cantava com voz feminina era o Ney Matogrosso, de canto bonito e expressão infinita, dotado de uma técnica de cantar perfeita. Depois do Ney, surgiu o Edson Cordeiro, um fenômeno capaz de executar barítono, tenor, contralto, soprano, numa maestria singular. Pena que este tenha desaparecido do cenário nacional: é assim a cultura brasileira de hoje, que renega os bons. Se Matogrosso e Cordeiro são dois antigos e potenciais talentos, esse Pablo é lamentável como artista.
Numa vã tentativa de assemelhar-se a uma mulher, a atual “revelação”, com cabelos compridos, vestido curto e falando e cantando em falsete, mais parece um participante perdido e desgarrado dos blocos das “piranhas” do Carnaval. A voz é feia, frágil, irritante, rachada, e o cantor não tem técnica nem competência para usar o que já não é nada bom. Um pseudotalento criado pela mídia, sem nada que possa lastrear o rótulo que lhe dão.
A área cultural no Brasil de hoje é isso. O declínio foi grande, houve um quase aniquilamento da nossa cultura. Copacabana fechava os finais de ano com apresentações de Tom Jobim com Mílton Nascimento, Chico Buarque e Caetano Veloso. Hoje os sertanOjos (como diz Rita Lee), funkeiros, pagodeiros, cantores de axé é que dominam a MPB, tão esfrangalhada e aviltada pelas gravadoras, pelos intérpretes e compositores e pelo mau gosto popular.
Caímos da poesia de Belchior pro ridículo nada-dizer do Michel Teló, de Jessé pra Luan Santana, de Gal Costa pra Anita, de Bethânia pra Valeska Popozuda, de Tim Maia pros Mc's. Uma verdadeira degradação artístico-cultural. O caos da cultura. Caos este que não é mais que um dos reflexos e uma das facetas do deplorável caos social, moral e político que hoje o Brasil vive e do qual imagino que infelizmente jamais irá se libertar.