sábado, 30 de dezembro de 2023

ONDA

 Que coisa é essa que vibra no meu peito?

Seria um grito, música, agonia;

Seria arroubo, afã, fogo de vida?

O que brinca assim na minha alma

Tão baça, pálida, obscura?

Seria uma cantiga que vencesse o tempo,

O siso, os desencantos e a fadiga,

As agruras, os percalços e as vivências,

E se instalasse em mim qual flor no árido?

O que será que dói, que canta ou que extasia,

Ou que tortura ou desvanece e não decifro?

Mas que onda é essa que vem, rebenta assim de súbito

Na calmaria  quase que imóvel deste meu mar

Assim tão quedo, na linha do equador?

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

HOMEM DE FERRO E CIMENTO

 Quem não se encanta com sons de uma canção

Nem se rende a um olhar angelical de um animal...

Quem não se enleva em contemplar as verdes matas

Ou ver o mar a tocar o céu bem no horizonte...

Quem não delira nas paixões mais extremosas

Nem ama ser algum neste planeta...

Quem não se deixa bulir por arte alguma 

Anda e vegeta, sem viver jamais.

Não mais do que um robô de carne e osso,

Não tem alma nem carrega sentimentos,

É rude e insípido qual pó de asfalto

A voar pelas pistas sem poema e sem canção.



O ABANDONO À ESPERANÇA

 Deixemos de lado toda esperança:

Ainda pensamos como há cem anos,

Ainda amamos os generais e caudilhos

E os influentes senhores feudais.


Esqueçamos os sonhos de dias sublimes

Pejados de paz, felicidade e alegria

E ergamos nossas taças, brindemos

Ao nada, ao nada, não mais do que ao nada!

sábado, 2 de dezembro de 2023

NAS ANDANÇAS DO PODER - QUINTA PARTE: "O LATIFUNDIÁRIO"

O agricultor Isaías José Simão de Andrade refestelou-se na poltrona, colocou os pés sobre a mesa de centro da enorme sala da casa grande da fazenda e, enquanto assistia ao julgamento de um dos implicados nos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023, resmungava para seu advogado:

--Olha só, Azevedo!  Punir um trabalhador com 17 anos de cadeia... Que desgraçados!

--Tudo por causa de um comunista safado... -- acrescentava o causídico.

Isaías, mais conhecido como Zeca Simão, chefe político de uma cidade goiana de 200.000 habitantes chamada Nova Colômbia, participou com vultosas quantias do financiamento daquele movimento de terroristas e vândalos que acamparam em frente ao QG do Exército (com a a anuência e a simpatia dos militares) no Distrito Federal e depredaram depois as sedes dos Três Poderes.  Investira pesado nos atos golpistas e vibrara quando os depredadores romperam as frágeis e complacentes barreiras e adentraram as edificações públicas.  Alegrara-se com a resistência de membros do Exército a deixar que a polícia efetuasse prisões no acampamento.  Frustrara-se profundamente, todavia, quando Lula deixou de recorrer à G.L.O.(Garantia da Lei e da Ordem) para reunir-se com os governadores e evitar que os estados aderissem ao movimento.  Esmurrara a mesa a que se sentava e levara uma das mãos à cabeça com extrema desolação:

--Puta que pariu! Sem G.L.O. esse desgraçado vai governar!

O plano era a adesão dos extremistas de direita nos 27 estados da Federação  e a  convocação das forças armadas para controlar a situação e demorar-se indefinidamente na gestão da ordem, até que fosse impossível Lula permanecer no governo.

Agora ele rosna para o advogado, um brilho odiento nos olhos:

--Olha, Azevedo, eu gastei uma fortuna pra esse filho do demônio não assumir, e agora tô vendo os patriotas sendo presos, além de ficar na espera que algum oficial de Justiça venha aqui me citar pra prestar depoimento, mas vou te dizer uma coisa -- e levantou-se, agora exaltado -- :  eu juro pela memória do meu pai, do meu avô e do meu bisavô que tá pra nascer o macho que vai me botar atrás das grades!  E o oficial de Justiça que aparecer aqui por minhas terras vai ser tratado com chumbo, com muito chumbo!

E não eram vazias as suas ameaças.  Se antes Zeca Simão era uma espécie de deus de Nova Colômbia, respeitado e temido até por traficantes e milicianos, depois de Bolsonaro baixar a portaria que facilitou o acesso às armas, o fazendeiro passou a ter a sua própria milícia armada, e distribuía ordens e diretrizes pelos quatro cantos da cidade com uma desenvoltura de general ou rei absolutista.  Tornou-se uma espécie de deus.

Tinha métodos violentos: fazia ameaças, designava capangas para aplicar surras e cometer assassinatos.  Vez por outro fazia ele próprio o chamado trabalho sujo, da mesma  forma como seu pai, avô e bisavô faziam para merecer sua tão grande veneração.  O bisavô, a pouco mais de um decênio para findar o século XIX, contratara e liderara um grupo de marginais e aventureiros,  e pusera-se a grilar terras públicas e a usurpar propriedades de outros fazendeiros, em batalhas sangrentas e assassinatos absolutamente covardes, tornando posteriormente tais homens brutais seus capangas e seguranças.  O avô, que dividira a herança do genitor com dois irmãos, valera-se dos mesmíssimos expedientes para ampliar os latifúndios herdados, com a diferença de que já encontrava-se estabelecido naquelas  propriedades.  O pai, por sua vez, limitara-se à grilagem, mas ensinara-lhe e incutira-lhe a "arte" da usurpação e da violência; mas Simão não precisara de mais do que algumas ameaças para estender seu império agrícola, comprando a preços bastante abaixo do mercado  duas fazendas que anexou ao seu imenso feudo.

Após o agricultor baixar o tom e sentar-se e refestelar-se novamente na poltrona, um tanto quanto exaurido, o advogado procurou tranquilizá-lo:

--Simão, você nem precisa de uso de força pra não te acontecer nada. Vocês, agricultores , têm alguma coisa em torno de quatrocentos parlamentares defendendo seus interesses.  Ninguém é maluco de querer prender um homem como você... a não ser que... -- e soltou uma gargalhada -- a não ser que queira que mudemos a Constituição e coloquemos quem quiser te prender na cadeia.  Além disso, nós perdemos uma batalha, mas jamais a guerra.  Lembre-se sempre disso.  Veja: o general Júlio César Arruda acabou demitido pelo Lula por rebelar-se contra ele, o que mostra que o comunista não leva uma vida confortável ante os militares.  O comando do Exército ficou então com o general Tomás Paiva, que pregou o respeito à democracia, à alternância do poder e ao resultado das urnas, mas não é o único líder das forças armadas.

--Isso é verdade.  -- concordou o outro.

--Pois é... Sendo assim, menor mijada fora do penico e esse comunista de uma figa  tá deposto, preso, exilado, e a gente dele vai toda junto.  Essa "esquerdalha", como dizia o nosso Bolsonaro, vai toda se foder também.  

--Que Deus te ouça!

--Mas vai ouvir, não tenha dúvida! E tem mais:  nossos amigos bolsonaristas tão dando um trabalho do cacete pra essa escória esquerdista.  Os comunistas não têm paz, nossa gente sabe perturbar e tirar o sossego como ninguém.  Vê como aporrinham o Flávio Dino?

--E é pra aporrinhar mesmo...

--E agora temos do nosso lado o Rodrigo Pacheco, que bancou o democrata, arrotou estado democrático de direito pra lá e pra cá, e agora  faz acenos ao eleitorado bolsonarista de Minas, com a PEC que limita as decisões monocráticas do Supremo e quer dar ao Congresso poderes pra rever e modificar decisões do STF.

--Não confio no Pacheco.. Atrapalhou muito nosso projeto de tomada do poder com esses discursos aí que você falou. O que ele quer é ser prefeito ou governador de Minas e daí pular até pra Presidência da República

--Mas agora é pra confiar, Simão!  Ele agora é gente nossa!  

Azevedo fez uma ligeira pausa, continuou:

--É preciso que atentemos também pra importância do atual cenário.  A má-vontade de inúmeras alas militares com o Lula fez que o Brasil voltasse àquela liberdade vigiada do início da chamada redemocratização, o que torna a situação dos chamados democratas muito frágil.  E, se você analisar bem, a possibilidade de o Trump ganhar nos Estados Unidos, ganhar do Biden, que foi um grande empecilho aos nossos planos de poder, acende uma esperança muito grande, porque a verdade é que Trump logo vai estar eleito e não vai se opor jamais a que tomemos o poder da mão dessa gente.

--Uma questão de tempo.  -- concordou o fazendeiro enquanto olhava pro longe.

--Sim, uma questão de tempo.  E existe um fato concreto que você nunca pode esquecer:  o Brasil é do agro, meu amigo. Você conhece poder maior?


sexta-feira, 24 de novembro de 2023

O BRASIL E COMO SERÁ O FIM DO MUNDO

 Xi Jinping, em reunião com Joe Biden, disse que "o planeta Terra é grande o suficiente para os EUA e China".  Independentemente de lermos na frase uma conotação imperialista, do tipo "vocês ficam donos do Ocidente e nós continuamos proprietários do Oriente",  o mais importante é que a declaração fez suspirar de alívio o mundo inteiro, já que o presidente chinês passou a impressão de não ter pretensões belicistas contra os americanos.  Essa tranquilidade, contudo, pode até ser relativa, já que  os ianques não conseguem de modo algum domar a Rússia e a Coreia do Norte, igualmente armadas até os dentes.

Assisto a tudo isso com uma impassibilidade de estátua, porque, além de não torcer por nenhum desses times (nem contra tampouco), sempre achei que nunca, jamais, em tempo algum o mundo poderia ser destruído por uma guerra atômica, já que apertar o botãozinho que lança uma bomba nuclear para um país levaria infalivelmente a uma resposta imediata do agredido (com outro artefato do mesmo ou maior poder de destruição), e nunca ouvi falar de um estadista, déspota ou ou o que quer que seja que estivesse, fora das linhas do discurso, disposto a morrer por seu país. Todo mundo quer matar, mas ninguém quer morrer.  Além disso, ao contrário do que muita gente pensa, não se trata de algo tão simples como premir um botãozinho e pronto.  A menor consideração sobre esse ato faz que entendamos que ele requereria ativar vários mecanismos, com direito a uma ou várias confirmações ou desistências em dispositivos de altíssima tecnologia.  E não paramos aí:  é fácil deduzirmos que é necessário que venha uma decisão do governo, em consonância com o alto comando do poder político e das forças armadas.  Pois, se assim  não fosse , imagine se um presidente doido estivesse mesmo disposto a ir pro outro lado.  Ninguém acharia justo que uma população inteira fizesse a viagem com ele.  Há cabeças capazes de chegar a pensar que possa um único sujeito ser designado a um plantão de 4 a 8 horas diárias, para ficar parado e olhando fixo pro tal detonador. Não pode de forma alguma ser assim, porque e se o cara pirar?  Se ele descobrir que a mulher o traiu e achar que a vida e o mundo não têm mais nenhum valor?  Se o indivíduo ficar brocha e perder toda a motivação de viver?  Se fosse o Pazuello, dormiria  debruçado no painel.

O mundo, ou ao menos a civilização e as espécies, só será destruído por energia atômica se houver um acidente nuclear -- falo acidente, não uso doloso de armas de destruição em massa.  Em não havendo um sinistro não-intencional, nossa extinção se dará pelas barbaridades que China, Rússia, Estados Unidos, Brasil, Indonésia e outros países destruidores do planeta vêm fazendo contra o meio-ambiente, atos que provocam temporais, secas, vendavais e tragédias ambientais terríveis.  

Às vezes tenho a impressão de que o Brasil sente um orgulho descomunal em ter um papel de grande destaque na empresa de findar com a vida no planeta.  Não posso ver de outro modo o sentimento do país,  por seu tão lamentável, nocivo, desgraçado, bestial e demoníaco papel no contexto mundial.  Porque, se estivesse eu equivocado, os governos de todos os âmbitos, no presente e no passado, além das autoridades, dos políticos e dos manda-chuvas  dos Três Poderes, dos empresários, dos agricultores, de todos os poderosos, ter-se-iam e ainda estariam empenhados em frear o desmatamento, as queimadas,  o garimpo ilegal e outras práticas absolutamente nefastas do poder econômico (quer legal ou ilegal) dentro do território nacional.

A quase total inércia  do poder público é um estímulo e um consentimento ao crime ambiental, e, enquanto as condições para a vida no país e no mundo vão ficando inapropriadas, os devastadores deslocam-se frequentemente para regiões mais confortáveis e propícias ao seu bem-estar, enquanto orquestram e comandam, seja em rápidas visitas aos pontos que devastam  ou a partir de ordens emitidas de pontos distantes do planeta, tocando sua infame atividade de devastar o mundo e as espécies, não sofrendo sanções senão as mais inócuas, além de terem dos membros do Estado a quase (em alguns casos total) cumplicidade, uma complacência, um respeito e uma reverência de que não têm o menor merecimento, pois são os vermes mais perniciosos que já tocaram a face da Terra.

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

A AMANTE

 Por que eu não iria embora,

Se cá nós trocamos injúrias,

Com ela é a mais pura luxúria,

E aqui nosso tédio é demais?


Não peça a mim que não vá,

Se a moça se encanta co'a Lua

E quer se banhar das estrelas

E, cálida, vem me beijar.


Por que eu ficaria sem ela,

Que aperta as mãos minhas nas suas,

Cantando uma linda cantiga,

E pisa nas águas do mar?


Tem tanta esperança nos olhos,

No rosto, um sorriso que é luz,

Na cama, delírios frenéticos,

No sono, uma paz sem igual.


Por que deixaria essa moça,

Se volto aos dezoito de idade,

Se sonho qual fosse um menino,

Se agora só entendo de amar?

domingo, 22 de outubro de 2023

NOSTALGIA III

 A juventude acesa, as mil emoções, mil anseios,

Os dias luminosos, o rock e os amores efêmeros 

A funda tristeza dos amores perdidos

E a mais indescritível alegria de viver.


Não tenho jamais a insana, descabida quimera

De desejar minha volta aos vinte de idade,

Mas quero a alacridade das cheias manhãs

E das tardes se abrindo na festa da vida,

Assim como flor desabrochada ao sol claro.

Não quero, não, as assombrações de minh'alma

Em seus gemidos apavorantes, agoureiros e tétricos.

Só busco fazer que a folia dos dias

Adentre inteirinho meu coração desbotado.

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

AS CLASSES COMO SE VEEM E A REPÚBLICA DOS BOBALHÕES

A maneira como as classes sociais se veem no Brasil chega a ser risível: o pobre se vê como classe-média baixa, o classe-média baixa se vê como classe-média- intermediária, o classe-média- intermediária se vê como classe-média-alta, e todos odeiam pobres e defendem os ricos e os da alta classe média com unhas e dentes, de um modo veemente e canino, numa demonstração impressionante e espetacular de burrice. Já a classe média alta e os ricos, por sua vez, se dizem pobres ou classe-média-baixa e odeiam e desprezam todas as outras classes citadas anteriormente, além de sugá-las de um modo tão vampiresco que as torna a cada dia mais esquálidas e raquíticas.  Por isso o Brasil só progride no topo da pirâmide.

Uma vez o Gilmar, um infeliz que conheci na era Collor, que ou está hoje com 86 anos  ou sofrendo martírios terríveis na imensa ala dos imbecis lá do Inferno, me disse que eu tinha inveja dos ricos e deveria lutar para me tornar um deles em vez de atacá-los, e que tudo faria  para tornar-se ou à filha única membro da elite.  Duvido que tenha conseguido, se era mais pobre e mais burro do que eu.  Uma outra peculiaridade desse personagem esquisito é que ele idolatrava um primo nazifascista da esposa, sujeito que defendia que pobre devesse ser morto pra doar compulsoriamente os órgãos aos ricos. Garanto que nenhum abastado iria querer o cérebro do Gilmar. 

Ser anticollor e antidireita, naquela época, me valeu uma vez, numa mesa de bar, um cerco de reacionários que me colocaram na berlinda e foram às raias da ofensa pessoal e estavam dispostos a partir pra agressão física por minhas ideias progressistas. Saí dando-lhes as costas e nunca mais falei com aquela gente fétida.

Uma lição que tiro dessas questões é que as classes mais altas são felizes e não confessam, e as outras são infelizes e não sabem.

Tudo isso são coisas desse nosso "Brasil brasileiro", esse "mulato inzoneiro" que é predominantemente racista além de fascista.

Somos a República dos Bobalhões.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

O MEDO

 O medo envolveu-me de súbito,

E não me consegui libertar.

Falei: "Arreda-te já 

E volta pro fundo das trevas,

Pro inferno de onde vieste!"

Ao que ele me respondeu: "Não venho de canto algum

Nem mesmo surgi do nada:

Não lembras que te sou um pedaço

E moro dentro de ti?"

sábado, 23 de setembro de 2023

CABEÇA DE VELHO EM CORPO DE JOVEM

 Já vi algumas vezes certos homens maduros dizerem: "Quem me dera ter vinte anos com a cabeça que tenho hoje. "  Seria um chato, um jovem insuportavelmente chato, enchendo o saco de outros com algumas considerações tediosas próprias da maturidade, alguns momentos enfadonhos de conversa sisuda nada palatáveis pela mocidade. Sem contar o insucesso com as moças, que o achariam simplesmente um porre(!). Melhor mergulhar em outras divagações, pois essa de um benquisto de cabeça de velho em corpo de jovem seria como "Deus dar asas à cobra", o que um velho ditado diz que jamais aconteceu.

A MINHA VELHICE E NÃO-INFERIORIDADE, E OS RETRÓGRADOS

 Já fui chamado algumas vezes(principalmente nas redes sociais) chamado de velho, em grande parte das ocasiões com a entonação que torna a expressão (velho) pejorativa.  Mas eu sou velho(!), assumidamente velho(!), e no entanto isso não me faz menor do que ninguém.  Não me torna inferior a quem quer que seja.  Tenho 65 anos e  algumas mazelas físicas

de idoso. Minha cabeça não é de idoso , porém. Fisicamente estou em consonância com a idade cronológica, o que desmente que a idade esteja na cabeça: tá é no corpo mesmo(!), e não adianta alguém de alta idade  ficar-se vendo como  na primavera da vida, porque o organismo envelhecido e gasto pelo tempo irá mostrar à criatura seus anos reais no mundo. Mas sobre mim pergunto: e daí que sou velho?  Ao menos não encampei o falso moralismo e ranço de muitos velhos, nem aquele hipócrita princípio  que preconiza a importância da família  não afetiva, mas institucional, tampouco prego outros anacronismos irracionais e estúpidos que tristemente vejo alguns idosos e jovens (também falsamente) alimentarem.  O tempo não corroeu meu pensamento libertário nem me fez um velho rançoso a defender tabus e preconceitos cheios de bolor e vazios de consistência e de razão.  Minha cabeça permaneceu não digo jovem, mas despojada das ideias  senis, retrógradas, pseudomoralistas, ridículas e descabidas que norteiam muitos velhos e jovens por aí.  Falo que não digo que minha mente não é jovem porque não é a juventude, mas o poder de analisar o mundo e as coisas com clareza (pelo menos enquanto o Alzheimer não vem) e de formular e não preconceber pensamentos é inerente a qualquer ser racional, independentemente da idade. Ou seja, uma mente nebulosa e tapada ou aberta e esclarecida é algo que não está de forma alguma intrinsecamente ligada ao tempo de nascimento.  Em suma, pensamento não se divide em jovem e velho, mas em claro ou obtuso.

sábado, 16 de setembro de 2023

A ULTRADIREITA TÁ TRANSFORMANDO A HISTÓRIA NO "SAMBA DO CRIOULO DOIDO"

A extrema-direita está, decididamente, definitivamente, determinada a transformar a história não só do Brasil, como do mundo, no mais autêntico "Samba do Crioulo Doido", suplantando fartamente o trabalho do grande Sérgio Porto, nosso saudoso "Stanislaw Ponte Preta", em humorística e ironicamente, e com muito talento, embaralhar os fatos e personagens  históricos.  Só que Sérgio Porto fê-lo propositadamente porque sua canção era um refinado trabalho de humor.  Ao passo em que a ultradireita é claudicante, desajeitada, bizarra, ignara, grotesca e despreparada.   Isso deve ser reflexo do "Brasil Paralelo", uma versão frustrada, esfrangalhada e patética do IPES (Instituto de Pesquisa Econômica e Social) do Golbery do Couto e Silva, que foi (o Instituto) embrião do golpe de 1964.

Depois de o secretário de Educação do Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, uma espécie de Bolsonaro de brinquedo ou arremedo de Bolsonaro (obstinado em reeditar o bolsonarismo -- "Bolsonaro 2, a Missão")... depois de Tarcísio e seu assessor passarem a assinatura da Lei Áurea da caneta da Princesa Isabel para a de  Dom Pedro II, de destituírem Jânio Quadros em 1961 da Presidência da República e o colocarem na Prefeitura de São Paulo, fizeram o mar chegar à cidade (ou a Cidade chegar ao mar) para o ex-presidente e ex-prefeito proibir o uso de biquíni nas praias.  Depois tem gente que não crê que a fé remove montanhas.  Se Tarcísio e seu secretário removeram o mar (ou a capital paulista).  diz agora que Deus não existe e não é onipotente!  como dizia Antônio Conselheiro, São Paulo vai virar mar e o mar vai virar São Paulo!  Nossa! Até eu fiquei maluco nessa!  Acabei de deixar os defuntos da minha árvore "ginecológica"  se revirando no túmulo!

Como não bastassem as mancadas do governo Tarcísio, cujo chefe é idólatra de Erasmo Dias e deu-lhe o nome a um viaduto (talvez achando o coronel linha-dura da ditadura mercedor do Prêmio Nobel da Paz e fazendo-lhe a "justiça" que estava ao seu alcance [do governador]... como não bastasse tamanho ensaio de "Febeapá" (Festival de Besteiras que Assolam o País", obra humorística do mesmo talentoso jornalista e escritor Lalau) da parte de Bozo Segundo, vem agora, no julgamento dos primeiros réus dos atos terroristas do 8 de janeiro, "Dia da Infâmia" (nas palavras da Ministra Rosa Weber), o advogado de um deles e embola as pernas de Antoine de Saint-Exupéry com os braços de Maquiavel, o pescoço de "O Príncipe" com as orelhas de "O Pequeno Príncipe" ... e acusa o pensador florentino do século XV/XVI de ter dito que "os fins justificam os meios".  Lalau choraria de inveja se fosse vivo: nunca pôde imaginar humoristas e comediantes tão sobejamente superiores a ele.  

Adiante,  para que fique muito bem entendido o que eu digo, reproduzo a letra do "Samba do Crioulo Doido".  Posto também a música, primorosamente cantada pelo "Quarteto em CY", que o Blogger fatal e infalivelmente vai arrancar do meu blog, por achar que quero ganhar acessos com o trabalho dos outros.



SAMBA DO CRIOULO DOIDO (SÉRGIO PORTO)


"Este é o samba do crioulo doido.

A história de um compositor que durante muitos anos obedeceu o regulamento

E só fez samba sobre a história do Brasil.

E tome de Inconfidência, Abolição, Proclamação, Chica da Silva, e o coitado

Do crioulo tendo que aprender tudo isso para o enredo da escola.

Até que no ano passado escolheram um tema complicado: a atual conjuntura.

Aí o crioulo endoidou de vez, e saiu este samba:


Foi em Diamantina,  onde nasceu JK

E a princesa Leopoldina arresolveu se casar.

Mas Chica da Silva tinha outros pretendentes

E obrigou a princesa a se casar com Tiradentes.

Laiá, laiá, laiá, o bode que deu vou te contar


Joaquim José, que também é da Silva Xavier,

Queria ser dono do mundo,

E se elegeu Pedro Segundo.

Das estradas de Minas, seguiu pra São Paulo

E falou com Anchieta.

O vigário dos índios

Aliou-se a Dom Pedro

E acabou com a falseta.

Da união desses dois ficou resolvida a questão

E foi proclamada a escravidão


Assim se conta essa história,

Que é dos dois a maior glória.

A Leopoldina virou trem

E Dom Pedro é uma estação também.

Oô, oô, oô, o trem té atrasado ou já passou?




 

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

A ARTE

 A Arte é linda como um campo a se adornar de flores várias.

A Arte é linda como nudez e como amar em delírio inominável.

A Arte é comovente assim como paixão que traz luz e canto à alma

Ou como simples beijo enternecido de mãe no seu do bebê.



A Arte é santa e doce como cães pueris a nos pedir afagos.

A Arte é elevada e grandiosa como os gestos mais prosaicos,

Quando as almas se purificam e se emprenham de pleno amor.



A Arte é linda como cascatas, como florestas, qual aves muitas em revoadas.

A Arte é sagrada quase qual mares, luares, serras, cerrados, onças, jacus, bujios, antas,  [harpias, os animais.

É majestosa, miraculosa, encantadora e até parece a própria inefável Mãe-Natureza.



O ponto comum e de encontro entre a Arte, o Amor e a Natureza é o Magnífico.



DORMIR

 Já notei seus olhos brandos,

Suplicantes, me chamando:

Vou deitar em nossa cama,

Vou dormir em sua paz.


sábado, 12 de agosto de 2023

A MULHER DESNUDA

 A nudez da mulher é tão linda!

Relevos sublimes ante olhos sedentos,

Rosa se abrindo em pétalas róseas,

Em pétalas rubras ou pétalas púrpuras.

As grotas tão mornas de pura magia,

Caminhos ardentes ao Sétimo Céu.


A mulher desnuda, poesia divina,

Estendida no leito, é linda qual rio

Em campos celestes ornados de cores

Ao canto sublime das vozes de arcanjos.


A mulher despida, cantiga lasciva

Tão cheia de vida, de luz e pulsar.

A mulher que se despe é uma diva que pousa

Na cama suave e a converte num céu.


sábado, 29 de julho de 2023

O IMPÉRIO DO DIABO

 Não sonharei jamais um mundo melhor

Nem nutrirei no velho peito a menor ilusão,

Se as criaturas nada importam se equiparadas aos capital, 

Se o poder, a guerra e o triunfo nas batalhas

Revelam a alma dos homens de forma bem cristalina...


Se os animais sublimes que vemos nos campos

São sempre mortos com crueldade satânica:

Não há beleza alguma nos campos.

Se cada pessoa é solitária ao extremo,

E as cidades, inchadas de gente, são simplesmente desertas.

Se os amores são calculados e tão pragmáticos,

E dos casamentos, então... melhor nem falar.


Se mãos humanas bestiais, tão imundas,

Dão vida a ainda mais cataclismos:

Vendavais, calores, secas, inundações.

Se a ignorância é mensageira e bastião dos malignos

Que semeiam pobreza, miséria, a fome e o caos...

Se a natureza agoniza, encolhida, estuprada

Pela ganância dos vis magnatas.



Cada humano abriga na alma um demônio

--São demônios dos mais variados tamanhos--,

E eu, às vezes, me desolo bem fundo,

Enquanto luto por conter meu diabo

E me furto a mensurar-lhe as dimensões.





domingo, 25 de junho de 2023

O QUE DIFERE A EXTREMA-DIREITA DA DIREITA

 A direita e a extrema-direita são igualmente egoístas e antidemocráticas (esse negócio de direita democrática é balela) mas guardam algumas diferenças entre si. Ambas não gostariam que povo votasse, mas, enquanto a direita trabalha pra manter o eleitorado ignorante, a extrema-direita prefere o voto de cabresto, de papel e com os escrutinadores sob a mira de espingardas.

A direita pensa 24 horas por dia em como tirar mais dos trabalhadores para agigantar ainda mais os lucros das elites e,
135 após a Abolição da Escravatura, acha viável a reinstituição da escravatura, enquanto a extrema-direita já reinstituiu impunemente o trabalho escravo.
A direita acha que não deve existir direito de greve, ou que todo grevista leve muita porrada da polícia pra aprender a ser submisso. Já a extrema-direita quer que os grevistas apanhem, sejam presos, torturados e mortos, com a extensão do martírio a seus familiares.
A direita move mundos e fundos pra desacreditar, desmoralizar e aniquilar politicamente seus adversários. A extrema-direita, por sua vez, quer seus oponentes presos, exilados ou assassinados.
A direita não tá nem aí pra esse papo hipócrita de "Deus, pátria e família" dos integralistas, enquanto a extrema-direita insiste em fingir que valoriza e zela pelas três instituições.
Em suma, a diferença básica entre direita e extrema-direita é que a primeira gosta de explorar, extorquir e usurpar por meios refinados e maquiavélicos, enquanto os extremistas gostam de manter e ampliar sobejamente suas vantagens com massacres, derramamentos de sangue em massa, genocídios, explosões e outros meios absolutamente hediondos.





A SOCIEDADE BRASILEIRA AINDA É A MESMA DOS ANOS DE CHUMBO

 É perda de tempo, desperdício de energia, burrice discutir, debater ou tentar argumentar com um bolsominion. Vários analistas já disseram e repisaram que Bolsonaro não criou o bolsonarismo: o extremismo de direita já estava arraigado, latente, pulsante numa parcela altamente significativa da sociedade brasileira.  O capitão expulso do Exército só foi o abre-alas, o escancarar das porteiras para essa gente liberar, dançar, bradar e praticar toda a sua sordidez, perversidade, injustiça e cinismo tão peculiares.  Ou acaso algum maior de sessenta não se lembra de que, nos tempos da ditadura, muitos pais e avós rememoravam o fatídico dia do famigerado  golpe com uma alegria de debutante, deliciando-se da lembrança do momento em que Mourão Filho, Magalhães Pinto e outros golpistas colocaram seus meganhas armados até os dentes em marcha? 

Após o maldito evento, era muito comum, já no auge da era da repressão, observarem que "fora a melhor coisa acontecida, porque era mister acabar com aquela 'patifaria' de greves, manifestações, 'arruaças'", tudo reações legítimas de cidadãos por qualquer motivo insatisfeitos com a própria condição social e o total desprezo dos patrões e setores públicos para suas causas.

O falso moralismo tomou conta das famílias e da mídia.  Não podia haver triângulo amoroso nas telenovelas, a produção musical foi objeto de severíssima censura.  Afinal o regime se fingia muito voltado para o bem-estar da família, e o contexto era inspirado na "marcha da família com Deus, pela liberdade" (marcha, aliás, da qual Deus esteve absolutamnte ausente), em que a classe média, imbecil como sempre foi e será, deu as mãos às elites e se tocou pras ruas a defender a grande propriedade e os latifúndios, como se fora também rica (aliás, sentindo-se abastada), como se defendesse o que houvesse de mais justo e virtuoso, sem a menor consciência de que era um ente numeroso e rastaquera naquele movimento.

Lembro-me perfeitamente daqueles tempos de pós-1964, em que os casais pais de família ficavam de suas janelas de quarto escuro e cortina fechada a observar as filhas dos vizinhos que chegavam de carro com os respectivos namorados e com esses trocavam algumas carícias ousadas.  Era depois uma série de comentários à boca-pequena, que só perdiam força quando se tomava conhecimento de que alguma outra mocinha (ou aquela mesma) era descabaçada.  Virge! Nossas "impolutas" famílias se lambuzavam com aquele prato delicioso como o próprio manjar dos deuses.  Era fato, entretanto, que aqueles verdadeiros sentinelas da moralidade, quando estavam ainda habilitados para o pecado, tinham lá, marido e mulher, suas amantes e seus amantes, muitas das vezes os homens deixando esposa e filhos carentes de coisas essenciais e básicas, já que gastavam muito com alguma outra mulher mais graciosa e com os abortos que tanto condenavam, mas praticavam em nome da preservação do sacrossanto ambiente familiar.  Quando as respeitáveis senhoras casadas engravidavam de alguém que não fosse o marido, a solução era mais simples:  o cônjuge comemorava o nascimento da criança com um riso de orelha a orelha e muita cerveja, certo de ser seu o recém-nascido.  Afinal eram todos religiosos, tementes a Deus, pessoas de bem, e uma boa e grande mentira ia-lhes muito melhor do que uma verdade imoral.

Assim como hoje os predominantes protestantes renegam as seitas africanas, os predominantes católicos da época renegavam-nas como ao próprio Diabo, embora não fosse extremamente raro recorrerem aos orixás quando achavam que Deus e os santos do catolicismo estavam demorando a proporcionar-lhes prosperidade, a morte de algum desafeto ou a mulher ou homem de alguma outra criatura.  

O racismo e a homofobia eram declarados em alto e bom tom, apesar de muitos dos preconceituosos serem também mestiços e oportunamente se envolverem em carícias e atos sexuais com criaturas do mesmo sexo. As drogas também eram veemente condenadas e muito usadas.  Mas o que são pequenas contradições numa sociedade ciosa do seu dom religioso e dos seus deveres cívicos?  Havia filhinhos ordeiros de casais exemplares e bondosos que estupravam (e alguns até matavam) por aí, mas, se algo fosse descoberto, eram vistos com leniência pelas autoridades policiais e tomados como rapazes imaturos e peraltas, que ao amadurecer "tomariam jeito".   Aliás, essa coisa de estupro, tal como espancamento de mulher e feminicídio,  sempre foi cultural  por aqui, sem que muita gente se sentisse indignada  e revoltada com a incidência desses casos tanto ontem como hoje.

O único pecado capital, imperdoável, irreparável era a desobediência aos desígnios dos nossos senhores detentores do poder.  Nada de greves, manifestações, protestos, críticas aos militares, pois tais atitudes podiam culminar em prisão,  tortura e morte -- inclusive dos entes queridos dos torturados. Mas o que, segundo a visão da gente daquele tempo, que outro destino poderia merecer um "mau cidadão"?

O homem de bem era, antes de tudo, aquele que não proferisse nenhuma palavra ou praticasse qualquer ato contrário à ordem estabelecida.  Homens assim eram dotados de grande disciplina, grande caráter,  grande patriotismo, grande civismo.  Fica assim fácil entender porque a violência contra mulheres, negros, homossexuais era tratada com tanta condescendência.  A mentalidade da sociedade, implicitamente, acolhia como uma espécie de recreação de uma população bem-comportada essa gama de crimes revoltantes e deploráveis que mencionei.

Ah! Quase me esqueci de comentar que aquelas famílias de bem se metiam em muitas falcatruas também.  Havia muita corrupção naquele verdadeiro império da mais absoluta decência.

Ao final da ditadura militar, quando Tancredo Neves foi eleito pelo Colégio Eleitoral e, ante seu impedimento por morte, José Sarney, civil, tomou posse,  achei que caminharíamos indefinidamente dentro de um Estado Democrático de Direito.  Em 2017, quando Bolsonaro anunciou sua candidatura à Presidência da República, achei que não teria ele a menor chance, pois pensava aqui comigo que, 32 anos depois da redemocratização, as viúvas da ditadura, do extremismo de direita e do regime de exceção estivessem em sua absoluta maioria mortas.  Meu erro crasso foi não contar que esses saudosistas tivessem deixado vivo seu pensamento torpe, cruel, calhorda e cínico, como um ser que espalha excrementos por onde anda, que inocula micro-organismos nocivos em toda corrente sanguínea que encontra, e os seus filhos e netos são a sua mais perfeita reprodução e reencarnação... reprodução e reencarnação de criaturas que não deveriam sequer ter nascido.

Bolsonaro perdeu a eleição presidencial, mas a direita e extrema-direita lotaram o Congresso Nacional, as regiões do Brasil, à exceção do Nordeste, estão contaminadas pelo pensamento extremista de direita, e os ataques aos negros, mulheres, homoafetivos, umbandistas, candomblecistas, os achaques de autoridades e políticos, os estupros, violência de todo gênero, além de as elites permanecerem no memso processo de usurpar tudo das classes menos favorecidas.  As pessoas não mudaram nada! O Brasil não mudou nada!  E ainda vive perturbado e amedrontado pelo fantasma do nazifascismo que não para de nos rondar.

sábado, 27 de maio de 2023

MELANCOLIA III

 Se a tristeza me tocou, tão inclemente

Como dedasse uma ferida viva em sangue

Bem no meio do mais fundo do meu coração...

Se mergulhei no passado mais distante

E lamentei o que foi e aconteceu

Além de tudo o que não houve ou ocorreu...

Se tanto andei dentro de casa como autômato

E me sentei, deitei, silente como um quadro estático

E tão parado como olhar que fita o longe tão somente...

Se me fiz mudo, quedo, quedo como estátua

Em beco escuro, deserto e enegrecido pelo tempo

E não quis sair pelas tão tristes ruas da cidade...

É que nada, nada pode ter razão alguma,

É que a alma em mim se encheu de sombras

E de um canto triste, melancólico, inaudível, 

E pisei no nada, e adentrei o nada, e o nada é dentro deste apartamento

Que dá vista a tudo o que não há, não é, que não existe,

Não se vê, não se encontra nem vislumbra, não se encontra simplesmente.


sábado, 25 de março de 2023

A CONSPIRAÇÃO DAS ELITES

Não é possível que as pessoas de espírito democrático não se tenham apercebido, mas é notório que existe um complô gravíssimo  em andamento, e esse conluio tem ampla participação da mídia e principalmente das "Organizações Globo", que vêm sistematicamente colocando Lula na condição de vilão no embate do presidente com Roberto Campos Neto e na sua despreocupação em afagar os chamados "mercados".  

Vamos primeiro tentar elucidar o que diz respeito à "Globo", que servirá de paradigma para que entendamos a questão do restante da mídia.   A emissora é uma representante, uma preposta, uma advogada fiel, retórica, veemente,  ardorosa e canina do mercado financeiro.  O porquê disso é fácil entender se nos perguntarmos: quanto a emissora e seus proprietários e dirigentes investem em especulação no mercado financeiro?  Quantos dos seus anunciantes jogam nessa ciranda de ganho fácil e rápido?   Quantos megaespeculadores têm influência direta sobre o conglomerado midiático (Globo) e retirar-lhe-iam o apoio caso os globais não os defendessem como mães leoninas?  Em suma: a "Globo" defende os seus anunciantes, seus donos e gestores e todos aqueles  que nela investem de algum modo.  Ficam entendidos, então,  os motivos de comprar de peito aberto a briga dos chamados "mercados", que são um bando de indolentes que investem fortunas imensas em tudo o que não produz sequer um alfinete, e não geram um  posto de trabalho que seja.  Quer dizer, gerar empregos até que geram, mas unicamente para alguns operadores de suas jogadas no mundo das finanças, tão poucos a ponto de serem absolutamente irrelevantes no que concerne ao que podemos chamar mercado de trabalho. 

Bolsonaro, não veiculando nada através da emissora,  submeteu-a a um processo de estrangulamento financeiro que a induziu a fazer ferrenha oposição ao ex-presidente, apesar de achar Paulo Guedes, por sua desumanidade e obstinação em tirar tudo das classes não-abastadas para dar aos do topo da pirâmide,  uma espécie de deus protetor dos ricos.  Queria Bolsonaro fora e Paulo Guedes dentro.

Agora vamos analisar outras questões e entender o tamanho do bolsonarismo.  

Bolsonaro é uma invenção da mídia, dos militares e dos megaempresários de todos os setores.   Os militares queriam voltar à cabeça do poder e conseguiram: embora aparentemente fossem cegamente obedientes ao seu presidente-títere, na verdade obtiveram privilégios e regalias que só os milItares das ditaduras obtêm, além de não se incomodaram nem um pouquinho em desemprenhar o seu papel no teatrinho do quem-manda-quem-obedece.  Os empresários queriam alguém que propiciasse-lhes ficar mais opulentos do que já eram e acabaram recebendo mais do que pediram a Deus: Bolsonaro é o pai dos ricos.  A mídia entrou na história para conquistar os mesmos  benefícios dos senhores de empresas e cumpriu sua voluntária função de grande arauto: "O Brasil está desequilibrado e só será feliz  e estável  se eleger Bolsonaro!"  Deu no que deu:  o capitão se elegeu, abençoou mídia, milicos e ricos,  mas deixou a "Globo" e a "Folha" de fora.  

Você pode agora perguntar: "Depois da política absolutamente contrária a vacinas, com tantas mortes por covid, com tantas queimadas em nossas matas, com garimpo e desmatamento ilegal e tanto martírio dos yanomâmis, as elites, a mídia  e os militares se mostram tão saudosos da aberração que chamaram de presidente?" A resposta é simples: cada um quis e quer o seu, o seu poder e dinheiro lotando os bolsos, nada se importando com o que ou quem  morre, sofre, fica cego, mutilado, retalhado, esfolado, martirizado, triturado, incinerado ou o que quer que seja. "Apoiam o pavoroso", você volta a indagar, "apesar do evidente perfil autoritário? "  Ora, eu respondo,  as elites sempre se beneficiaram de todas as ditaduras capitalistas do mundo (as ditaduras comunistas foram ditaduras, mas jamais comunistas).  Os ricos são os protegidas de todos os governos autoritários, e o seu poder econômico suplanta fartamente o poder bélico dos fardados, que deles recebem ao invés de expedirem ordens, ou seja, subordinam-se aos opulentos.  E tem mais: falar em direita democrática é o mesmo que admitir a existência de um leão vegano.

Voltando à questão central, o complô em andamento,  a mídia vem fazendo um trabalho ostensivo de desgastar o governo Lula ante a opinião pública, em prol dos especuladores, de si própria e de  magnatas que lhes dão ordens claras e objetivas.  Diante de tal quadro, o que muito estranho é o fato de o PT não colocar a militância nas ruas, para empunhar cartazes e bradar palavras de ordem no intento de fazer contraponto a esse movimento que podemos chamar no mínimo de mesquinho.

 


domingo, 12 de março de 2023

PRECE ODIENTA


Quem se sente superior a cães e gatos

Ou a qualquer outro animal

É na verdade inferior a qualquer seixo ou verme,

Mas ressalvo que o seixo é mineral

E o verme não tem do mal que faz nenhuma consciência.

Quem se vê melhor que um inocente bicho

É bestial como Nero, Hitler e Calígula

E, cínico e sórdido,  se recusa a aceitar que é verdadeiro

Que a supremacia sobre as outras espécies deste mundo

Não é um direito humano, não, jamais.


Deus, se existis, nunca os perdoeis

E infligi-lhes em dobro o mal que sempre causam

Aos nossos irmãozinhos de patas e focinhos,

Às criaturas das águas, da terra e com escamas.

Uni, meu Deus, os não-demonizados

No combate a tais homens podres, vis.


Castigai-os sem clemência ou piedade,

Condenai-os ao inferno em plena vida 

Destinai-lhes os calabouços, sofrimentos,

Não lhes deis jamais, jamais a paz.

domingo, 26 de fevereiro de 2023

FAMÍLIA

 Família é um grupo de pessoas  que (independentemente de vínculos sanguíneos),  morando e vivendo não necessariamente sob o mesmo teto, se ligam por laços de amor e de afeto.  O mais é mera instituição.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

AS RUAS DA POESIA

 Eu preciso, sim, que os [seresteiros se revezem

Em suas cantigas lamentosas, [doces, cheias de passado,

De saudade, nostalgia, de paixão [e solidão.


Eu preciso sair atrás dos violeiros

Que espalham poesia pelas ruas,

Pelos bares, becos, por jardins e [por pracinhas,

Arrebanhando em seu caminho a [multidão.


 Quero seguir a turba nessa [marcha maviosa

E sair murmurando cantos lindos

Como quem acompanha, [devotado, a procissão.


Quero fios de lágrimas nos olhos [das mulheres;

Quero os homens cheios de ilusões da [adolescência,

A alegria e a tristeza se abraçando

Num sentimental e elevada [comunhão.


Quero ver em cada ser humano [um poeta,

Em cada olhar, uma uma paixão, [pureza romanesca,

Em cada casal, uma entrega [simplesmente transcendente

E a poesia irmanando toda a [gente emocionada,

Em sentimentos tão sublimes e [repletos da mais plena [enlevação.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

"MEU PASTOR"

"Meu pastor, meu bom pastor,
Grande mestre após Jesus, 
Arrefeça-me a aflição:
É que estou desempregado,
Me sustendo dos biscates: 
Se eu doar verba pequena
À igreja de que é líder,
Arderei no fogo eterno?


Meu pastor, então me explique
De que vale enfim bondade,
Compaixão e caridade,
Ter amor e retidão?
É preciso os predicados,
Mas, sem notas, nada feito?"


"Homem santo, me elucide:
Se doar dinheiro grande,
Eu consigo no futuro
Me tornar um milionário?"


"Meu pastor, meu missionário,
O meu ódio aos que não creem
E aos católicos e espíritas
Não me tornam um ser alto
Ao olhar do Criador?"


"Meu pastor, o seu prestígio
Me terá grande valia.
Meu pastor, não quero muito:
Vida longa, quase eterna,
Com saúde e juventude,
A mais bela das mulheres,
A fortuna dos nababos
E, ao morrer, rumar pro Céu."

sábado, 11 de fevereiro de 2023

NUNCA MAIS NOS ESQUEÇAMOS DO DIA DA INSURREIÇÃO DOS RICOS

 Como fico impressionado quando vejo um classe-média ou pobre defender Bolsonaro!  Nem vou-me referir a todas as barbaridades que ele disse e fez, mas somente ao fato de o inominável ter governado exclusivamente para os ricos, em grave prejuízo de todos aqueles não inseridos no rol das elites: esmigalhou os salários dos trabalhadores, pretendia reduzir drasticamente o valor do benefício decorrente da LOAS (Lei Orgânica da  Assistência Social), salário mínimo pago a idosos, deficientes e incapazes que não contribuíram ou contribuíram  menos do que o determinado por lei para a Previdência Social e que não têm condições de trabalhar; além disso queria diminuir a importância paga a alguns aposentados, sem contar que tinha planos de mudar o cálculo de reajuste de outras aposentadorias e do salário mínimo de modo que esses direitos fossem sempre revistos abaixo dos índices de inflação.   

Por que essas pessoas amam tão ardorosamente os ricos e o ex-presidente, que é total e absolutamente desprovido de virtudes?  Por que esse amor tão extremoso de tantos pobres e economicamente medianos pelos ricos?  Seria fruto daqueles contos de fadas  que na infância líamos ou ouvíamos, em que todo herói ou heroína nascia rico ou depois da pobreza enriquecia no final da história, e de reis muito bondosos, justos  e heroicos, que zelavam por seus súditos como mães exemplares?

Por que quase metade da população brasileira é fascista, quando só os milionários ficam a salvo dos inumeráveis malefícios da extrema-direita, até beneficiando-se (e muito) de todas as crueldades do regime?  Por que tantos participantes e não-participantes dos atos terroristas do Oito de Janeiro (que não deve nunca, jamais ser esquecido) queriam tanto o sucesso de um golpe articulado, apoiado e financiado pelas  pelas mais altas classes sociais, até hoje defendendo a insurreição dos ricos contra o resultado das urnas, que conduziu Lula ao invés de Bolsonaro à Presidência da República?

Há muito desisti de encontrar explicações para o fenômeno, mas sugiro que nós, democratas, em momento algum nos desviemos, e lembremos sempre que, a despeito de nem todos os terroristas serem abastados (mas patrocinados por abastados), o 8 de Janeiro de 2023 deve ser sempre lembrado como o dia da Insurreição dos Ricos,  para que um espetáculo tão bizarro, devastador, injusto, sórdido e odiento como aquele nunca mais se repita na história do Brasil.