segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

DOS QUESTIONÁVEIS PREJUÍZOS DECORRENTES DOS FERIADOS

 O ano de 2022 terá a maioria dos feriados caindo em dias de sábado ou domingo, para tristeza dos empregados e grande alegria dos patrões.   A mídia e um bocado de gente por aí sempre apregoaram pelos quatro cantos do Brasil que um feriado causa um tremendo prejuízo à Nação, mas isso é mentira.  Mentira deslavada, e eu explico por quê.

O que há no feriado é um represamento temporário da demanda, e isso acarreta, em compensação, um grande aumento de procura de produtos nos dias úteis subsequentes.  Se o seu chuveiro queimou em pleno domingo ou feriado, tão logo as lojas abrem, você corre e compra outra resistência ou outro chuveiro, mas não passa a tomar banho frio ou a não tomar banho em consequência de um dia de casas comerciais fechadas.  Assim o movimento no comércio e na indústria aumenta  logo a seguir e de forma considerável, gerando uma sobrecarga de trabalho para os funcionários, por conta dessa saída mais volumosa  de produtos decorrente do período em que estes ficaram retidos , sendo tudo compensado em todos os aspectos,  e o faturamento dos empresários não sofre no frigir dos ovos nenhuma queda que possa fazer escorrer fio de lágrima de um canto de olho. 

Dizem também que o erário deixa de arrecadar uma fábula: outra inverdade: na reabertura da economia, o aumento das vendas faz que o governo arrecade o que capitalizaria se não tivesse havido dia parado.  A União, Municípios e  Estados recolhem para seus cofres o que recolheriam se fosse uma semana só de dias úteis, para exultação dos irmãos Centrão, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, com o orçamento secreto seu e dos outros membros do bloco parlamentar governista a que pertencem,  figuras que são os grandes beneficiários e  o  objetivo sagrado e principal da arrecadação federal.

A única  perda, ou melhor, redução de ganhos  acontece quando os patrões são obrigados a pagar aos seus empregados o dia ou dias não trabalhados, mas a margem de lucros fica quase incólume ao final do mês, pois não são os repousos e feriados que quebram empresários, mas efeitos da política econômica de governantes conservadores, cruéis e sórdidos, que são inimigos implacáveis do poder de compra das classes trabalhadoras, governantes que eles próprios, patrões,  defendem com unhas e dentes e com uma torpeza esperta e simplesmente ignóbil.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

NÃO PENSE EM MIM

 Quando a noite for  calada e for escura de amedrontar,

Quando o dia teimar, obstinado, em não chegar,

Quando o silêncio se apossar da casa: a sala, o quarto, 

A cama, os cômados, a mesa, as janelas e o sofá,

E a solidão pousar sobre o seu corpo as mão geladas,

Não se lembre, por favor, por um minuto sequer de mim.



Quando quiser fugir da escuridão, da dor, do medo,

Mas nada salvo o abismo houver ante os seus olhos,

Não, não pense em mim, nem mesmo um único segundo,

Nem tente imaginar a claridade que até que poderia

Ter sido o nosso mundo, que é  imaginário,  que não nasceu.



Vá, encare a noite, o frio, o tédio, o abismo

E atire-se no mais profundo do mais profundo

Do mais profundo breu  silente que se venha a apresentar...

Mas não pense, não, jamais em mim...

Pois sigo sempre e só será você lembrança vaga,

Tão desbotada, tão fugidia, sem relevância,

Que até seu nome, eu  asseguro, esquecerei.


domingo, 12 de setembro de 2021

O TEMPO E A PANDEMIA


Tinha os meus dezoito, a juventude,

Tinha a minha tristeza descabida

E as  calçadas  da Penha tão festiva,

Das acesas noites de verão.

Tinha as moças em vestidos diminutos,

Espalhando beleza pelas ruas

E os bares destilando carnavais.


Tinha os meus cinquenta e a viveza,

A poesia irresistível do pecado,

O Severina de Laranjeiras em festa,

Um desejo de viver tão permanente,

Um soltar-me pelas luzes da cidade.


Os sessenta adentrei alegremente,

Fincando os pés na alegria de Araruama,

Degustando um poema  ensolarado,

E  me enchi de sentimentos coloridos:

Tempo doce de viver, beber e amar.


Mas chegou de repente a pandemia,

E busquei um quieto lugar em Minas,

E, bem antes da entrada nos setenta,

Eu me vi como na casa dos noventa,

Prisioneiro de um tédio melancólico,

E vegeto num pavor inominável

Pois é tempo de clausura, dor e morte.

sábado, 26 de junho de 2021

A CANDIDATURA DE CENTRO


Quando tomei conhecimento de que os conservadores estão procurando uma alternativa a Lula e Bolsonaro, ou seja, uma terceira via de centro... Pois é, quando soube que buscam alguém de centro, pensei logo nos vários babalorixás, médiuns, cabeceiras  e cambonos que há no Brasil.  Seriam eles nossa solução? -- fiquei considerando com meus botões.   Porém depois entendi que a questão não tem nenhuma relação com as religiões vindas do Continente Africano:  eles procuram alguém que, segundo sua versão, não seria nem de esquerda, nem de direita, nem conservador, nem progressista.  Ah, tá... Não entendi nada!  Você já viu alguém, quanto às desigualdades sociais, não ser a favor nem contra, muito pelo contrário?  Não deu pra compreender, não foi?  Também eu próprio fiquei com o microcérebro todo emaranhado.     Pelo que vi, é alguém que não seja nem sim, nem não.  Agora ficou mais claro?  Não tem problema: a cada minuto, por minha vez, assimilo menos o que tô repetindo feito papagaio:  as asneiras que a mídia e os políticos de direita , os conservadores, os reacionários andam propalando pelos quatro cantos do País.  

O problema é que predomina a hipocrisia, e a direitaça inventou uma expressão aparentemente menos desumana pra empurrar goela abaixo do eleitorado seus candidatos direitistas e avessos ao desenvolvimento social, aos trabalhadores, às classes menos favorecidas, que por esses perversos senhores são vistos como escravos, meras  peças de trabalho.   Políticos inseridos nesse grupo uniram-se e formaram uma frente no Congresso chamado "Centrão", que se deveria, na verdade, chamar "Oportunistão", força política que a nada visa além dos interesses pessoais.   

Quando entendi que não seria o citado candidato nenhum candomblecista, umbandista ou kimbandista praticante, mas um político profissional, desenvolto, esperto, desses que dão nó em pingo d'água, passei a imaginar qual seria o nome escolhido.  Seria o Rodrigo Maia???  Não, esse não cola.  Se, adversário radical do Bolsonaro, não pautou os mais de cinquenta pedidos de "impeachment" que recebeu (muito embora Arthur Lira já tenha quebrado seu recorde), imagine se fosse aliado do inominável. Mais: se Rodrigo Maia é de centro, eu sou o "Che" Guevara.   

Candidato de centro... Isso é uma das grandes picaretagens políticas que já inventaram, e a grande malandragem  das elites  reacionárias é que terão duas opções:  Bolsonaro e o tal "centrista".  Ou você acha que essa gente não tá contente com o atual presidente?   Pois saiba que os banqueiros, agricultores, pecuaristas e megaempresários estão felicíssimos com o mandatário, pois os banqueiros ficam, por conta da política econômica do Paulo Guedes, a cada dia mais ricos, e os agronegociantes, voltando sua produção pra exportação, recebendo por ela uma fábula em dólares, ainda se dão ao luxo de cobrarem os tubos pelo resquício de produtos alimentícios que ficam aqui pelo País. Ou seja, estão rindo de orelha a orelha com os lucros que vêm obtendo com a pandemia e  pouco se lixam com os que morreram ou ainda vão morrer.  Essa gente é igual ao Bolsonaro: não tem empatia.  e, se estivesse insatisfeita com presidente, há muito que este já teria sido despejado do Alvorada.

É justamente para não correr o risco de ver vencer algum candidato progressista que compõe com a direita e a extrema-direita ao mesmo tempo.  Não pense que isso significa que as forças de direita concorrerão divididas: elas apostam em dois corredores e, ainda antes do final do primeiro turno,  irão abandonar o que tiver menor projeção eleitoral, pra investir ultrapesadamente no de melhor desemprenho, após os dois haverem arranhado e espancado, e danificado bastante a candidatura afeita às causas sociais que aos ricos se contrapuser.

Bolsonaro pra eles não é intragável, porque defende com gana, unhas e dentes os interesses econômicos dessas castas, que desde os primórdios  da história do Brasil  não têm o menor pudor em defender Belzebu ou Satanás, e agora vêm, através da mídia e de outros espaços políticos, anunciar, a pretexto de combater os radicalismos, a busca por uma terceira via moderada e equilibrada, quando na realidade procura desmontar o cenário eleitoral que hoje se desenha, em que Lula pode agrupar em torno de si os progressistas e tornar-se peça fundamental na retirada da "coisa" do Palácio do Planalto.  É mais uma conspiração de grupos privilegiados que ainda creem em comunismo e veem o fantasma de Karl Marx até no fundo do copo do uísque caro  que tomam.

domingo, 16 de maio de 2021

CARMELO PIROGA, "O PEIXE ENSABOADO", E A PERGUNTAÇÃO

 O pai de Carmelo Piroga tava indignado.   Que história era aquela mais estranha de  o filho, depois de ir trabalhar na prefeitura da cidade, resolver virar puxa-saco daquele prefeito famigerado das unhas, virando uma espécie de boneco daquele cabra ruim que nem o Demo? 

A família se reúne, cada um espichado no seu canto da sala, e espera o filho degenerado chegar.  Logo esse adentra o cômado e se assenta bem no meio de todos, cabisbaixo, murcho que nem só,  já com os cornos meio vermelhos. Sem muito rodeio e nenhuma enrolação, Ornan, o pai, conhecido nas redondezas como Ornan Malheiro,  procede logo ao início das interrogações:

--Escuta aqui, seu cabra fio de uma égua, que conversa é essa de você tá ajudando esse cabra safado desse prefeito a fazê o diabo aqui nessas banda?

O tio Ilmar Assis, no mesmo momento, alerta o sujeitinho acabrunhado e com ar de cachorro que mijou no sofá:

--Ói, meu fio, tu tem que dizer a verdade, tá sabendo, né? por mais que doa, tu tem que dizer a verdade...

--Mas tio, inté já esqueci qual foi a pergunta...

Ao que o pai reage com um berro:

--Tu tá ou não tá ajudando esse prefeitinho filho do capiroto a fazer o diabo aqui nesta cidade?

--O prefeito da cidade, paim? -- o sonso tentava ganhar tempo.

--É, seu nojento!!!!!!!!!! Qem mais havera de ser?!!!!!!!!!!!!!!!

--Mas, paim, a mim num cabe imiti juízo de valor...

--Responde, seu pulha!!!!!!!!!  -- Ornan não aguenta e se exaspera de vez.

O tio até volta a intervir:

--Meu fio, entende bem: aqui é pra dizer a verdade...

--Mas eu tô falando a verdade, tio...

--Mas ocê num falou nada...

--Pois é, mas num menti, sinhô meu tio.

O pai se levanta, agora soltando fumaça pelas ventas que nem touro chucro ou maria-fumaça:

--Eu vou é arrebentá esse fela duma égua vagabunda dos inferno!!!!

O tio se levanta e contém o irmão furibundo, segura ele com a força, que nem sucuri  enroscada na presa.

Aí o primo, Márcio Robério,  também puxa-saco daquele prefeito parido das entranhas de uma chocadeira, resolve intervir só pra atrapalhar o interrogatório:

--O sinhô num pode falá assim com ele, não!  Só quero que me arresponda quem é o sinhô pra isso!!

E aí ganha o apoio do outro primo, Ednardo Voltão:

--É isso aÍ!! Com que artoridade cê acha que pode obrigar o Carmelinho a dizer o que não quer?!

--Ué? -- defende-se Ornan -- Mas ele jurou dizer a verdade.

--Mas a verdade é ralativa! -- tornou o tal do Márcio Robério.

Ornan levantou os braços, desesperado:

--Cês tá aqui é para atrapalhar, tá é de complô contra mim!

O tio Ilmar Assis consegue acalmar os ânimos e tenta ele próprio fazer uma indagação ao sobrinho:

--Fio, cê sabe que prometeu dizer a verdade.  Por isso eu quero que me arresponda um questionamento:  é verdade que tu taria, pelo teu chefe, exclusivamente pelo bem do teu chefe... é verdade que tu taria até disposto a sentar no preto colo, na clara esquina?

Ornan Malheiro arregala os olhos, quedado de indignação co'aquela atitude de escorregação do filho, o coração disparado que nem um vibrador desembestado, de novo é seguro pelo Assis, mas ainda assim  dispara:

--Seu cabra miserave, diz logo de uma vez!!!!  Tu é capaz de sentar no preto colo da clara esquina?!!!!!!!!!

Carmelo levanta os ombros:

--Oxe, pai, nem sei se ele quer isso.

--Mas ele sempre quis que as pessoas sentasse no colo do Benedito da Nigéria e que pra isso escolhesse a clara esquina,  esquina mais alumiada dessa cidade, seu cabra fraco da peste!!!!!  Tu é uma cabra fraco!!!!  Abestado!!! Mole!!!!  Tu é um Piroga mole!!!!  Um Piroga frouxo!!!!  Um Piroga sem força, desses que enverga à toa!!!!  Antes de tu minha famia nunca teve Piroga mole, seu nojento!!!! -- bradava o arretado Ornan enquanto tentava se desembaraçar dos braços firmes do irmão Ilmar, cabra forte e firme feito maçaranduba.

Um outro  tio moderado, Nórton Além-Mar, ainda tentou que o sujeitinho respondesse alguma coisa:

--Carmelo, todo mundo sabe que esse negócio da clara esquina é verdade, mas o que nós quer saber é se tu, caso ele te proponha essa vergonha... se tu tá de acordo, meu filho.

--Tio, sinceramente, a mim num cabe imiti juízo de valor sobre isso...

Foi uma doideira de alienista nenhum dar conta, sô!  Ornan já tava a ponto de sair no braço com Assis, tamanha a arretação que o filho molenga causou.  Não demorou e a reunião acabou, Márcio Robério e   Ednardo Voltão se rindo feito duas hienas pinguças, festejando a atitude de peixe ensaboado do primo, Ornan Malheiro saindo arrastado pelo tio Ilmar Assis, que na saída olhou  atravessado pro sobrinho e falou num jeito bastante aperreado:

--Só segurei teu pai pra apaziguar, mas tu merecia mesmo é uma surra de couro cru, de rabo de arraia e outras coisas mais.

Nórton Além-Mar saiu balançando a cabeça, indignado com aquela situação vexatória, fazendo uma cara de jiló danada pro ex-interrogado.

Quando todos saíram, Carmelo Piroga levantou os ombros e braços, e indagou a si próprio:

--Oxe, o que foi que eu disse pra essa gente ficar tão aperreada?






  

domingo, 2 de maio de 2021

OSMUNDO

 Naquele lugar tão estranho

de brigas, de armas e ganhos, 

de tudo que existe no mundo

entrou por engano o Osmundo.


Havia bebida de graça,

"bonecas", mulheres na caça,

casais transando na rua,

beldades dançando já nuas.


Num dado momento uma loura

do tipo que os dias doura

lhe trouxe um copo de quente,

chamou-o pro amor, sorridente.


Osmundo ficou num conflito:

ia ou não ia o aflito?

Se aquilo fosse arapuca, 

findasse num tiro na nuca?


Se fosse a bebida truncada,

se a loura com rosto de fada

não fosse às outras idêntica,

não fosse uma dama da autêntica?


Se o chefe do morro descesse,

cismasse com ele e lhe desse

sentença de morte por nada,

ciumento da loura assanhada?


Em pânico Osmundo sofria:

dizer um "sim" não podia,

dizer um "não" não devia,

fugir sequer tentaria.


Osmundo acordou urinado,

o peito a pulsar disparado,

jurando que à igreja voltava

e a vida devassa deixava.



sábado, 24 de abril de 2021

MEU VERSO

Meu verso é um canto ardente de vida e de morte,

É lassidão, quietude, tristeza profunda,

É dor aguda e calada furando no peito,

É uma alegria vibrante a vestir fantasia

E a mergulhar nas folias sem siso dos carnavais.

É Sharon Stone cruzando as pernas,

É Macunaíma a destilar pilantragem.

É bêbado triste a prantear nas esquinas,

É violeiro dedilhando modinhas,

É vida  brotando, florindo, a  dançar

No canto divino dos canários, pardais...

Meu verso é o ódio a queimar corações,

É o amor a afagar como a brisa em manhãs.

É o macho que adentra as entranhas da fêmea

Numa gana de gato, de cão, de leão,

Sussurro macio dos córregos brandos,

É noite silente e quieta de paz.

Meu verso  se faz dos quatro elementos:

Da terra, do fogo, da água e do ar;

Em si traz o cobre, o ferro, o carvão,

É bicho e é planta,  é também mineral.

Das substâncias do mundo, de todas, de todas,

De todas, todinhas é feito o meu verso.



DOS POEMAS QUE FAÇO III

 Eu faço poemas como quem solta a voz

Com todas as dores, amores, alegrias e afãs,

Todas as ganas do peito palpitante a cantar.

Eu faço versos como quem grita numa lira demente

E tenta espalhar essa lira fervente por todos os becos,

Por todas as  ruas, por todas as luas, por todos os céus,

Por todas as tardes, por todas as noites, por toda manhã,

Por todos lugares, por todos os mares, por todos os mundos, enfim.


AQUELA QUE ME REPUDIOU

 Aquela que repudiou há de estar muito longe,

A milhões de anos-luz da minha cidade,

No Paleolítico ou incontáveis  milênios à frente,

Mas equidistante no espaço e no tempo,

Num ponto inacessível de nenhum corpo poder alcançá-la.


Aquela que me repudiou há de estar tão inatingivelmente distante,

De sequer a memória poder encontrá-la

E o arranhão do meu coração cicatrizar-se de todo.


Há de estar em mim tão morta, remota, esquecida,

Que, se um dia avistá-la, eu apenas me diga:

Quem será essa criatura cinzenta,

Tão sem cor e sem luz e sem graça,

Que os olhos  cansaram do breve segundo que a  fiquei a fitar?


segunda-feira, 12 de abril de 2021

A MORTE DA POESIA II


 A poesia está morta, morta como nunca se viu, 

Esmagada pelo afã da luta dos homens

Por um lugar ao sol ou por motivos torpes,

Trucidada pelo pragmatismo do mundo sem lira

E a pandemia que assola o planeta e sobretudo o Brasil.


Não há mais seresteiro emocionado

A cantar seus lamentos de amor.

Não há mais violeiros nas ruas 

Dedilhando serenatas ao luar.


Não mais o navio a partir 

Sob o pranto de uma amada no cais. 

Não há mais ternura nos olhos

Dos amantes numa mesa de bar.


Não há mais brincadeiras de roda,

Nem meninos brincando de heróis.

Não há mais a quimera bonita

Nos projetos juvenis sem juízo.


Nem há mais o olhar de tristeza

De poetas piegas em versos

A lamuriar suas dores de amor.

Não há mais silêncio noturno

A encher as almas de suave canção.


E agora, poetas, calamos?

Se a poesia ficou anacrônica, 

Partimos então para a crônica?

Ou fazemos estrofes sem vida,

Sem lira, sem cor e sem dor?


Barão da Mata


[Apenas um aviso aos críticos de plantão: "morta como nunca se viu" é apenas um realce da expressão, pois morte é morte, e não há como algo estar menos ou mais morto, ou mensos ou mais intensamente morto]


ANTÍTESES (CAPITULAÇÃO)

 Ah, desculpa o mau jeito, querida:

Se te disse palavras tão duras,

É que foi tão demais a bebida,

É que foi tão de menos o afeto

Que me deste e me fez tão vulgar.



Os meus beijos te foram tão quentes,

Os teus olhos me foram tão frios;

Os momentos pra mim foram lira,

Mas pra ti foram ferro e cimento.

Ah, me conta por que fui à Lua

E por que não saías do chão.


Eu me dei a falar poesias,

E dizias dinheiro era tudo.

Ah, perdoa se fui tão amante:

Te perdoo se foste broxante.

Ah, mulher, me perdoa, que eu mudo

E me amoldo ao teu jeito distante.

Eu te levo a beber em Iguaba,

Peço caldos e até camarão,

E te faço sentir uma dama

Das que moram diante do mar.


É que tua boca me endoida,

Tuas coxas, meu Deus, ai, me matam!

O teu rosto bonito me encanta,

Teu corpo me faz delirar.

Ah, morena, nasci pra te amar!



[Esse poema é uma letra de samba que fiz para Marcelo Bizar, parceiros de tantas músicas, colocar uma melodia de samba.  Assim que ele musicar, divulgarei a canção]


sexta-feira, 9 de abril de 2021

BRANQUINHA

Vem pra mim, Branquinha, que te quero:

Vi um sonho se acendendo nos teus olhos

E me dei, encantado, a te sonhar.



Vem, Branquinha, que inda é tempo de viver,

E a vida cantará de novo em festa,

Em seu samba, sua dança, sóis e cores.



Vem, Branquinha, tornar música os meus dias.

Quero viver de poesia novamente,

Voltar a ouvir cantar os querubins.



POESIA FUNÉREA

 Parti pr'uma cidade mineira bem distante,

Sem deixar olhos marejados de saudade,

Sem poema nem canção de despedida,

Sem dilacerar meu peito na partida.


Olhei para a frente, para a frente tão somente,

Num afã de mergulhar em vida nova,

Mas, além destas paredes, é a morte o que me espreita,

E me contenho, amargando a escuridão do medo,

Alma prostrada, inerte, em lassidão.


O maldito mor e seus malditos companheiros,

Tumores todos purulentos dos infernos,

Fizeram deste sítio um desmedido cemitério,

País funesto, a peste a se espalhar pelas cidades.


É triste por demais esta clausura

Que tolhe o corpo, fere a alma e que nos enche,

Do pavor, da apreensão e da incerteza

De se o amanhã pra nós existirá.


sábado, 20 de março de 2021

O CARIOCA, O MINEIRO (VIAJANTES SE ENCONTRAM)

CARIOCA: Que conta de bom, meu amigo mineiro?

MINEIRO: Estou namorando uma moça do Rio.

E você, carioca, o que tem a contar?

CARIOCA: Uma bela mineira acende meus dias,

Tem ruivos cabelos, branquinha qual trigo.

MINEIRO: A minha é morena assim como a terra.

CARIOCA: A minha é serena qual córrego fresco.

MINEIRO: A minha é inquieta como os dias mais quentes.

CARIOCA: Se banha de lua nas noites de prata.

MINEIRO: Se doura  na areia do sol do verão.

CARIOCA: Seu gozo é cascata a formar turbilhão.

MINEIRO: O orgasmo são ondas batendo no cais.

CARIOCA: Tem cheiro de frutas, de relva e de campos.

MINEIRO: Odores de flores, de praia e de bar.

CARIOCA: Me enredou como a Iara nas águas dos rios.

MINEIRO: Me enlaçou, Janaína,   nas águas do mar.


sexta-feira, 12 de março de 2021

POR QUE DEVEMOS LER OS JORNAIS DA IMPRENSA ALTERNATIVA

Eu assisto ao noticiário e aos debates da Globo News, fui espectador fiel do "Manhattan Connection", programa liderado por Lucas Mendes e com a participação de Diogo Mainardi, Ricardo Amorim, Caio Blinder, verdadeiras almas devotadas ao mais cruel conservadorismo de direita, mas pessoas que sabem tudo, informam tudo, tudo conhecem. Ainda assim, porém, a Globo nunca lavou meu cérebro, jamais me arredou da posição progressista e da minha noção de justiça social. Opto pela G.N. porque tenho necessidade das informações de modo mais detalhado , recusando-me a ficar limitado a meia hora de noticiário com as reportagens sucintas demais para o amplo entendimento do cenário nacional e internacional.
Apesar de assistir à programação da citada emissora, vejo-a hoje mais tendenciosa do que nunca e não a recomendo, visto que a linha editorial do jornal "Em Pauta" é de um reacionarismo que beira o bolsonarismo. Quando Fachin anulou os processos de Lula em
Curitiba, a Eliane Cantanhêde esteve a um milímetro de elogiar Bolsonaro e seus asseclas, indo às raias de contar que indagara aos assessores do Bozo se a decisão poderia ameaçar as bases do seu líder, fazendo ainda questão de proferir inúmeras vezes a resposta dos bozistas de que Lula não representava nenhum risco e seria o adversário que o nefasto gostaria de ter em 2022. Claro que era um ufanismo deslavado dos extremistas de direita, mas que a jornalista fez questão de ressoar exaustivamente, talvez tentando convencer a si própria.
Era "Dia Internacional da Mulher", e só havia comentaristas femininas. Os debates transcorreram durante todo o tempo sob um estado de preocupação constante e quase histérico com um elemento muito venerado pela grande mídia, mas cuja nocividade seria captada dentro da menos acurada análise: o mercado financeiro. Mônica Waldvogel, Eliane Candtanhêde, Juliana Rosa, todas quase em desespero, como se tivessem um parente na U.T.I.
Duro você acompanhar as notícias através dos grandes órgãos de imprensa. Indigna profundamente essa defesa extremosa de vagabundos que ganham fortunas em poucas horas graças aos seus lances de jogadores viciados no mercado financeiro, que não geram um único posto de trabalho e nada produzem além de lucros altíssimos para si próprios. Gente que mantém a economia estagnada, que inibe o investimento na produção ganhando o protagonismo em cada vírgula e cada imagem da mídia, sem nenhum mérito para ocupar a posição que ocupa dentro dos interesses e preocupações dos órgãos de comunicação.
Meu hábito de ver esse tipo de programação é antigo, mas estou rompendo com isso: vou mergulhar nos jornais alternativos, como "Brasil 247", "Intercept","Revista Forum" e outros, porque têm mais compromisso com a verdade, senso de justiça social: não ficam repetindo aos quatro ventos as mentiras dos generais sobre não terem interesse em fazer intervenção militar e outras asneiras só cabíveis nos contos de fadas. Acaba ficando alto o custo de obter a notícia detalhada por essas fontes, porque você tem de acionar seu filtro cerebral o tempo inteiro e corre o risco de acabar engolindo uma ou outra mentira, sendo a maior delas o propósito dos militares de não irem além do papel a eles conferido pela Constituição. Ora, militar e Constituição são antônimos!
Tirem da Globo, Band, SBT, CNN, Rede TV, Record, leia também os jornalões, para um complemento ou acréscimo de informações, mas mantenha seu filtro mental vivo e em plena atividade. Não perca tempo aguardando um destaque de reportagem até o final da transmissão do noticiário. Assine algum jornal (alternativo ou não) e leia direto a matéria, sem ficar dando ibope aos produtos que essa gente vende nos intervalos comerciais de sua programação

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

"FOLHA DA BOZOLÂNDIA"

FOLHA DA BOZOLÂNDIA

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PRESIDENTE ASSINA DECRETO QUE ACABA COM A PANDEMIA

 




Nesta quarta-feira pela manhã, o presidente do Brasildistão, Jadir Bozo Nárus, em reunião com os deputados do "Meião", grupo de sutentação do governo, disse textualmente ao presidente da Cama dos Deputador, Tutu Bira:  "Vamo parar com essa palhaçada, esse negoço de ficar fechando o comércio, porque os empresário tá tudo ficando puto, e não tem cabimento o pessoal ficar adoecendo e atrapalhando a economia.  Primeiro que não tem pandemia nenhuma! Tudo é invenção de mariquinha e de cientista energúmeno.   Esse negoço de ciência não dá camisa a ninguém. Não se tem que cumprir ordes de governador nem prefeito nium  porque quem manda aqui sou eu e 'ordes' absurdas não se 'cumpre'.  Quem ficar de palhaçada agora e adoecer vai ser preso."

A votação da matéria será feita em caráter de urgência urgentíssima, e enfim será dado um basta na falsa crise sanitária que assola o país.


Tom Zé Diniz D' Antena




SAULO FEDES DEFENDE NO CONGRESSO SEU PROJETO DE VOLTA DA ESCRAVATURA

 






Em discurso feito no Congresso, ontem à noite, o ministro da Economia, Saulo Fedes, cobrou dos parlamentares agilidade no processo de votação da reinstituição, que, segundo o economista, nunca deveria ter sido abolida. "A Princesa Isabel só libertou os escravos porque era comunista, e comunista não quer construir nada de bom para a nação brasildistanesa."  Questionado por um deputado impertinente de  oposição, que argumentou que "a mão-de-obra assalariada é saudável para as classes trabalhadoras, a economia e a sociedade como um todo, que a abolição da escravatura não foi um presente da princesa, já que havia uma pressão muito grande por parte da Inglaterra para que os escravos obtivessem liberdade e trabalhassem a troco de salários, para poderem consumir os produtos industrializados", o ministro interrompeu o discurso do inconveniente: "Esse negócio de historinha não enche a barriga de ninguém."  No que foi aplaudido pelos deputados dos partidos de direita, principalmente os do "Meião".  No ensejo, o presidente da Fundação Damares, Célio do Amargo, que acompanhava Saulo Fedes, aproveitou para repetir: "Eu sou negro e não vou nunca me cansar de dizer que a escravidão foi boa pro negro!"

A PEC irá, por decisão dos presidentes da Câmara, Tutu Bira, e do Senado, Bendigo Xexêco, direto a plenário, sem necessidade de passar por uma CCJ, além de necessitar de apenas 8 votos para aprovação.  O opositor incômodo ainda tentouo atrapalhar a sessão, alegando que seriam necessários 308 votos para aprovação, e o ministro fez um gesto de mão com o devido desprezo: "Esse troço de 300 é só um detalhe! Por favor, deputado, não me venha com chorumelas!".  Nesse instante, foi aplaudido do pé pelos elevados e laboriosos governistas.  Após o encerramento dos discursos, o deputado Tutu Bira comprometeu-se com Fedes a convocar o conselho de Ética para analisar a possível cassação do deputado  oposicionista.


Pílvio Tantos


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"MEIÃO" ARTICULA SOLTURA E PERDÃO A DEPUTADO PACIFISTA QUE FEZ SUAVES CRÍTICAS À SUPREMA CORTE 

 


Em reunião convocada pelo deputado Tutu Bira, os deputados do "Meião" estudam uma forma de reparar o angelical deputado Jadiel Taveira, injustiçado pela Suprema Corte por  ter feito leves críticas à instituição e aos seus ministros. "Acho que a corte está se melindrando muito facilmente.  Minha esposa também é assim, e eu já sugeri a ela que fizesse terapia  vou recomendar o mesmo aos membros do Judiciário.  O difícil no entanto é reparar as injustiças sofridas por nosso querido deputado, e sabe-se lá que medidas exageradas eles futuramente poderão tomar contra aqueles que dentre nós venham a praticar atos inofensivos como atirar neles, explodir-lhes os carros ou atitudes não-danosas semelhantes.  Afinal nós somos um país democrático."  Avalia-se que o Congresso vá aprovar PEC que puna com destituição e prisão perpétua qualquer autoridade do Judiciário que expeça mandado de reclusão contra qualquer parlamentar, seja pelo motivo que for.


Pilas Fala Faia

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FOLHA DA BOZOLÂNDIA

Diretor Presidente: Eulávio Del Carajo

Diretor de Redação: Marlos Bozo Nárus

Diretor de Edição: Távio Bozo Nárus

Diretor de Reportagem: Dinardo Bozo Nárus

Diretor de só ficar Olhando: Filho Zero Quatro

Diretor de tudo  mais e de tudo já citado: Jadir Bozo Nárus


 


sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

RODRIGONEIRO(PRA CANTAR COM A MELODIA DE "JARDINEIRA")


Rodrigoneiro, por que estás tão triste?
Mas o que foi que te aconteceu?
Foi o teu DEM  que te passou a perna,
Que fechou com Lira,
Te obscureceu.

Rodrigo, o César
Envelheceu.
Disse: "Filho, não pauta o 'impicha' ":
Tu és só mais um omisso
Ante o tanto que morreu.






sábado, 6 de fevereiro de 2021

SONHO ABSOLUTO

 E se eu sonhasse, mas sonhasse plenamente

Como não houvera no universo nada senão a minha fantasia?

Se eu sonhasse como fora menino novamente

E vivera a primeira de todas as paixões?

E se eu sonhasse, mas sonhasse de maneira assim desmesurada

Qual não existira tempo, luto, dores e mazelas,

Nem o impalatável tédio do cotidiano e dia-a-dia?

Se eu sonhasse o olhar angélico da menina enamorada

Que gravei num passado já distante, nas linhas da minha poesia?

Se eu sonhasse me casar co'a loura sensual e alucinante

Que ostentava as coxas num vestido  provocante?

Se eu sonhasse de um modo tão louco e sem medidas

Que  mais parecesse não ter pés ou corpo ou mãos,

Me fizesse etéreo como espírito ou fantasma, devaneio tão somente?

Se eu sonhasse de uma forma tão poética, elevada 

De tornar o irreal a verdade absoluta?

Se eu sonhasse e desse ao mundo as costas,

E partisse nas asas do meu sonho como viajante aventureiro,

Sem querer jamais, jamais  voltar?


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

NAS ANDANÇAS DO PODER: QUARTA PARTE: "O PRESIDENTE"

 O Brasil começou a ver, estarrecido, os atos, as declarações e as aberrações de Bolsonaro, familiares, ministros e  asseclas.  Primeiro foram os elogios a Brilhante Ustra, torturador do regime militar, depois a defesa à ditadura e à tortura.   Eduardo Bolsonaro defendendo a reedição do AI-5, que dava poderes excepcionais ao Executivo nos anos de chumbo.  Carlos Bolsonaro, vereador, passa a ter um gabinete dentro do Palácio do Planalto, de onde, segundo alguns jornalistas, operaria o que estes nominaram "gabinete do ódio".    O inquérito contra Flávio Bolsonaro, acusado de peculato, começa a emperrar.  O procurador-geral da República, Augusto Aras, e algumas figuras do Judiciário parecem lenientes: um inquérito que não anda, um procurador que não denuncia o presidente por manifestações antidemocráticas contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.

A pandemia confina as pessoas em suas casas, Bolsonaro, num descaso absoluto, incentiva a exposição de seus seguidores nas ruas, sem uso de máscaras, e a doença vai-se disseminando. Em 04 de fevereiro de 2021, quase 229.000 mortos.   Sessenta e nove pedidos de "impeachment" contra o presidente e a recusa inflexível do presidente da Câmara dos Deputados em pautar um deles.  

A reunião de 22 de abril de 2020, a questão da Polícia Federal, Abraham Weintraub ofendendo o STF, Ricardo Salles propondo a "passagem da boiada" na oportunidade de encobrimento propiciado pela pandemia.  O Pantanal e a Floresta Amazônica, entre outros cenários ambientais, ardem em fogo, matando queimados centenas de milhões de animais. Depósito inexplicado de Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama.  "Vontade de encher sua boca de porrada " é a resposta do mandatário ao jornalista que lhe pede explicações.

Nada é respondido, nada é apurado, tudo fica impune.  Por menos de um milésimo por cento do que fez Bolsonaro, Dilma foi afastada em definitivo da Presidência da República.  Fico bem à vontade para dizê-lo,  porque estou muito longe de ser petista, lulista, lulopetista ou qualquer coisa do gênero.

Empresários e banqueiros, jogadores malandros do mercado financeiro felizes da vida com Bolsonaro e a estrutura de poder atual.

Tudo isso é parte dos caminhos, das andanças do poder nesta terra.


Fevereiro de 2021   


NAS ANDANÇAS DO PODER: TERCEIRA PARTE: "A REPÓRTER"

 Carol era ambiciosa, era-lhe mister subir rapidamente na carreira jornalística.  Antes repórter de rua de um jornal dedicado exclusivamente à página criminal, sentia-se desprestigiada , injustiçada e insatisfeita na carreira que abraçara com tanta alma e dedicação.  

Um dia o dono do jornal entendeu que seu lugar era a Redação, e durante uns seis meses Carol ali aquietou-se.  Depois achou que era hora de perseguir algo condigno, mais compatível com o seu talento e sua competência.  Foi aí quando procurou amizades entre jornalistas de um jornal de grande porte. Deu-se a frequentar as salas e seções da instituição, o que acabou tornando-a amiga de colunistas de projeção.  Pediu-lhes a intercessão para trabalhar em um órgão de impresna de maior prestígio.  Ali não havia vaga, e a moça, na esperança de surgir uma oportunidade, continuou a frequentar a mesma roda de amigos  e a lembrar-lhes com certa frequência que ainda mantinha o desejo de mudar de emprego.

Quando o diretor da folha  em que trabalhava soube de suas idas ao concorrente, resolveu demiti-la, mas isso pouco  a atingiu.  Jornaleco, pasquim infame que a submetera a ver corpos de todos os jeitos nas ruas e a remunerava de modo não satisfatório ainda que depois da mudança de setor, fez que Carol, moça de 25 anos e moradora da casa dos pais, em Laranjeiras, visse aquela demissão mais como um favor do que como uma punição.  Pôde então dedicar-se ainda melhor a tentar uma colocação na grande empresa jornalística, que tinha emissoras de tevê e outros recursos que traduziam o seu poder.

Ganhou na insistência um lugar como "freelancer", voltando a fazer reportagens de rua, o que não era exatamente o almejado, porém já um começo:  seria só saber transformar aquela chance num trampolim.  Pegou um avião pra Brasília, alugou uma quitinete na periferia e  deu-se  a cercar o Congresso Nacional, buscando sempre uma boa matéria, uma notícia de peso, mas mal conseguia adentrar as dependências da instituição. 

Adriano há muito era um deputado com influência sobre um número grande de colegas, Carol sabia da simpatia da empresa noticiosa pelo parlamentar, era notório que os patrões consideravam com grande apreço a possibilidade de apoiá-lo numa possível candidatura à Presidência da República no pleito de 2022.  Não só Carol percebia a sua grande importância, como também naqueles cercos ao carro e ao trajeto do político foi descoberta e observada de forma concupiscente por Rogério.   O motorista olhava-a sempre longamente, percorria os olhos dos pés à cabeça da moça, despia-a demoradamente com os olhar e foi o trampolim de que tanto ela necessitava.

Uma dia a repórter parou, sorriu para ele:

--Boa tarde!

--Boa tarde, princesa!

--Gosto de ver você e o deputado Adriano Ferraz juntos.  Ficam tão à vontade um com o outro, parecem amigos de longa data.

--Gata, a gente se conhece há muitos anos, ele é meu amigão. 

--Que legal! Que bom trabalhar com pessoa assim!

--Maneiro, gatinha...

--Diz uma coisa pra mim: depois do expediente vocês vão sempre descansar? Você não gosta de tomar um chope, um vinho...?

--Claro, gata!!! --- animou-se Rogério -- Tem dias que a gente sai precisando ser carregados.

--Ah, legal!  Bom pra descontrair um pouco.  

--E como é!

A moça olhou fundo nos olhos do homem:

--Você tem algum compromisso pra hoje à noite? Quer tomar um chope comigo?

A aceitação do segurança veio de pronto.  Combinaram e à noite encontraram-se num belo bar de Brasília. 

A repórter não poderia incluir o deputado no convite. Temera que Rogério o fizesse, mas para sua sorte(dela) isso não aconteceu.  A companhia de Adriano desprestigiaria Rogério e gerava o risco de tudo não passar de uma conversa a três, com insinuações maliciosas e luxuriosas e nenhum proveito para os objetivos da jornalista.

No encontro os dois foram bastante descontraídos, em poucos minutos já se beijavam ardentemente, falavam de suas preferências sexuais e fecharam a noite num motel. Carol era uma diva de bonita, afrodite na beleza e nos ardores.  Rogério regalou-se de toda aquela lindeza, aquele corpo moreno despido e de todo o seu fogo de fêmea sobre a cama.

Mais dois encontros aconteceram, e, no terceiro, ela pediu ao segurança que tentasse convencer Adriano a dar-lhe uma exclusiva acerca de sua trajetória política e liderança sobre outros colegas.  Rogério concordou e intercedeu com o político:

--Nem sei quem é essa Carol! -- relutou o outro.

--Puxa, Adriano!  Ela tá sempre aparecendo em reportagens de rua...

--Pois é... Só faz externas... Não sei nem se ela vai fazer perguntas que possam me ajudar em alguma coisa...

--Pô, Adriano! Tu faz o "script".  Combina as perguntas com ela...

--Pô, mas ainda assim...

--M'ermão!  Além de tudo ela fode gostoso pra caralho!! Tu vai perder essa!?

Adriano sorriu um sorriso bem cínico:

--Você sabe muito bem que eu seria incapaz de me aproveitar da situação e assediar uma profissional  no exercício da profissão.

Ambos gargalharam longamente, o motorista-segurança detalhou o comportamento da mulher na cama, porém ainda assim Adriano opunha alguma resistência.

--Dar entrevista a uma maria-ninguém é um risco.  Ninguém conhece ela...

-- Mas todo mundo conhece você.

--Eu sei, mas...

--Faz o seguinte: eu dou uma ligada pra ela, você combina a coisa do "script"...

--Beleza! Tá legal!

E assim foi feito.  Entretanto Carol, determinada e de natureza taxativa, ponderou:

--Desculpe, deputado, mas eu gostaria então de primeiro enviar ao seu e-mail as perguntas que eu vou fazer.  Se Vossa Excelência não apovar, eu faço as perguntas que o senhor quiser.

O parlamentar concordou, passou-lhe o e-mail, recebeu as perguntas, aprovou-as, mas ainda ligou para negociar:

--Suas perguntas estão ótimas!  Muitas são as que eu ia mesmo pedir que você fizesse.  Mas ainda assim eu pediria que acrescentasse outras que não estão entre as suas.

Carol concordou plenamente.    A seguir ligou pro diretor de reportagens da empresa jornalística:

--Consegui uma exclusiva com o Adriano Ferraz.  Ou vocês  me contratam e dão uma vaga nos estúdios, ou então vendo a matéria pra outra emissora.

Após algum debate entre os dirigentes, Carol recebeu do homem a resposta positiva, e aquela foi a primeira entre várias exclusivas de Adriano a ela, que passou com certa frequência a acolher no corpo os desejos do político,  homem há alguns anos bem-casado  com uma dondoca e pai de uma casal de crianças encantadoras.

Não há dúvida de que a relação da moça com Rogério passou a ser bastante cordial, mas sem nada de cama, como se nada houvera acontecido entre os dois.  Mas o motorista tinha muitos anos de bastidores do poder e não deu muita importância, já que conhecia perfeitamente como se dava esse tipo de jogo.


Fevereiro de 2021


domingo, 31 de janeiro de 2021

ENTREGA À POESIA

 Ah, me dar à poesia

como quem orasse ao cosmo

num fervor sem ter igual...!

Ah, cantar co'a devoção 

dos amantes à luxúria,

do guerreiro à sua luta...!

Ah, deitar co'a natureza

e deixar que adentre a alma

a cantiga a vir dos céus...!

Ver brotar poema-prece

dos amenos sentimentos,

das candentes emoções...

Confundir co'a lira a reza...

Ah, fundir a lira e a reza,

caminhando nas palavras,

levitando nos meus versos,

num amor de olhar canino,

co'a pureza de animal!

sábado, 30 de janeiro de 2021

MAS É CLARO QUE BOLSONARO VAI DESGOVERNAR O PAÍS COM PODERES TOTAIS

 Não há como Bolsonaro não ter, em curto ou médio prazo, poderes totais ou absolutos, quer por meio de golpe ou mesmo por expedientes absolutamente legais.  Se levarmos em conta que tudo o que se aprova ou rejeita no Congresso é decisão de  duas únicas pessoas: os presidentes da Câmara e do Senado.  Esses dois mandam literalmente nos votos da absoluta maioria dos parlamentares.  Disto isso, observamos que, como o Capitão Cloroquina quer muito uma nova Constituinte, o Parlamento, manso, dócil e interesseiro, vai dar-lhe o tão ambicionado presente  e ainda conferir-lhe o atributo de decidir sozinho acerca de todas as questões nacionais, criando, revogando e descumprindo leis a seu bel-prazer, exercendo direito de vida ou morte sobre cada cidadão.  Como se o apoio político e institucional não lhe bastassem, ainda conta com o respaldo de quase totalidade das tropas militares, das PMs e polícias civis, além de ter a seu favor, apesar da rejeição de 40%,   a bênção de uma parcela de 57% da população https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/01/crise-derruba-popularidade-de-bolsonaro-aponta-datafolha.shtml (os 31% que acham-no bom ou ótimo e os 26% que o veem como regular, aceitável, tolerável, palatável), gente movida pela nostalgia cruel quanto aos anos de chumbo e tortura, pela estupidez e desconhecimento da política e da história,  pela sordidez inata ou por tudo isso junto.

O quadro que se desenha para os próximos anos é Bolsonaro reeditar aqui o fenômeno italiano de Mussolini, que dominou a Itália com apoio dos camisas-pretas e outros milicianos.   Entretanto pelo seu jeito de ser rústico, ignaro, grosseiro, bronco e truculento,  vai ser igual a esses caudilhos  africanos, que mandam e desmandam, atiram, executam, empreendem uma gestão violenta, sangrenta e medonha. 

Que mesmo da memória dos  ignorantes e direitistas  não-bolsonaristas jamais se apague que Rodrigo Maia, que poderia ter extirpado um tumor maligno incipiente,  aproveitado o momento em que o presidente estava completamente isolado e rejeitado para assim colocar em votação o "impeachment", preferiu deixar que o nódulo se tornasse metástase que se espalhasse de forma incontrolável e irremediável por todos os tecidos e sistemas do corpo da Nação,  em nome, segundo dizem,  do deus mercado financeiro, que joga com risco zero e aufere lucros astronômicos, absurdos e não gera um posto de trabalho sequer.


DA "INDIGNAÇÃO" NACIONAL COM A CORRUPÇÃO

 Muito me  impressiona  a veemência e determinação dos cidadãos brasileiros em combater e atacar a corrupção... a alheia, é claro, porque a própria cada um dos  oitenta por cento de corruptos prefere manter incólume e intocada.


sábado, 9 de janeiro de 2021

AUTOBIOGRAFIA POÉTICA

 Vida, vivi tantos tantos amores

E provei tantas paixões, 

Amargando muitas dores;

Mas em mim há uma certeza:

As paixões têm gosto bom

Como manga e qual morango,

Como pera  e como anis.


Vida, degustei das aventuras.

Mundo, toda esbórnia é um poema,

Tarde clara em brando sol,

Primavera dentro d'alma

A sambar, vibrar em festa.


Ah, sofri tanto de amores!

Fiz sofrer certas mulheres, 

Mas me dei aos sentimentos 

Como um cão cheio de afetos,

Turbilhão sentimental.


Nunca fui religioso,

Não vivi o que é virtude, 

Mas virtude o que é, enfim?


Não juntei nenhum dinheiro,

Não me fiz um venerado

Pelo que é material.


Morte, sei, quando vieres,

Não trarás poema ou música,

Mas só dor e sofrimento;

Entretanto tua antítese

Eu vivi com toda a gana,

Cultivei as emoções 

Com o zelo de quem cuida

De jardins pelos quintais.