segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O ANTI-HERÓI II

Não, não há dúvida, não há sombra de dúvida:

Não sou em definitivo o audaz mocinho,
Que é belo, intrépido, que é pura
bravura:
Sou mal-encarado, temo até meu ronco,
Minha própria sombra.

O revólver do mocinho nunca erra o alvo
E o que só tenho é um estilingue e a mira risível.
O mocinho é austero, é seguro, tem mãos firmes,
E eu sou fraco, debochado, um bandido acovardado.

O mocinho arrisca a pele, eu me escondo até de chuva.
O mocinho é elegante, alto, forte, genial,
E eu me visto de farrapos,
Sou nanico, manco, tolo, a burrice ambulante.

O mocinho salva todos dos perigos deste mundo,
Eu empurro criancinhas de penhascos gigantescos,
Eu espanco as mulheres e os velhinhos indefesos.

Não, definitivamente, não sou um herói:
Feito um cão sem dono, deito pelas ruas;
Coço as partes íntimas ante o rubor das senhoras,
Preguiçosamente, vou-me deleitando
Em ser o bandido, mero vagabundo,
Um sujeito à toa, este anti-herói.

1993

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